“O
atletismo é indiscutivelmente o mais universal de todos os desportos. Nenhuma
outra federação congrega tantos países como a Federação Internacional das
Associações de Atletismo. Nenhuma outra modalidade goza de semelhante
acentuação olímpica”.
Sequeira Andrade
Ao falar-se do
atletismo – e para termos uma noção clara de que o mesmo é a forma mais antiga
de desporto e/ou a mais universal das modalidades desportivas –, teremos que
forçosamente recuar até aos primórdios da nossa civilização, mesmo até ao tempo
do homem das cavernas que, de uma forma natural, praticava uma série de
movimentos, nas actividades da caça e de defesa, onde saltava, corria, lançava,
ou seja desenvolvia uma série de habilidades relacionadas com as diversas
provas de uma competição de atletismo. Contudo, o atletismo sob a forma de
competição, teve a sua origem na grande civilização grega, cujo espírito
agónico era uma das suas características, desde os mais remotos tempos. Esta
realidade já se encontra nos Poemas Homéricos, onde a preparação física é
realçada como uma componente essencial da mundividência helénica. Segundo o
professor catedrático José Ribeiro Ferreira – um dos grandes especialistas de
estudos clássicos – “a paixão atlética emerge, assim, no quotidiano de um povo,
que desenvolveu o seu espírito de competição, através da participação em
diversos festivais e jogos que proliferaram nas diversas cidades gregas.
Imbuídos de [tal] espírito agónico, amantes do exercício físico e desejosos de
se superiorizarem aos demais, os Gregos gostavam de participar em competições e
jogos desportivos que reunissem a fina-flor dos atletas”. As primeiras reuniões
desportivas organizadas da história foram os Jogos Olímpicos, organizados pelos
gregos no ano de 776 a.C., cujo principal evento aí realizado foi o pentatlo,
que compreendia lançamento de disco, salto em comprimento e corrida de
obstáculos. Celebravam-se no santuário de Zeus em Olímpia e cujo principal
motivo eram celebrações e festividades religiosas, nas quais se integravam
jogos atléticos, que ali se realizavam de quatro em quatro anos. Os jogos
serviam amiudadas vezes de palco a conversações e a tratados de importância
geral para os Gregos. Não é por acaso que Olímpia foi escolhida, com
frequência, como lugar ideal para depositar o registo desses tratados e
preservar tais documentos. Era o tempo em que os atletas vitoriosos eram
recebidos com festejos nas suas cidades e cumulados de honras, sendo que os
jogos davam a impressão mais nítida de uma unidade grega.
Esta realidade
filosófico-desportiva é bem diferente nos tempos que correm, já que a cumulação
de honras vai mais para outro desporto que nos escusamos aqui mencionar, para
não ferir susceptibilidades, muitas vezes clubistas. É dentro deste contexto
civilizacional contemporâneo que, em 1975, a coberto de uma juventude irreverente, seria
fundado o Grupo de Acção Cultural e Desportiva de Mazarefes (GACDM), embrionariamente
consumado por nós, Manuel Vaz da Silva, José Maria Rodrigues Forte e Américo
Afonso da Balinha. Das profícuas actividades deste Grupo, o atletismo foi
sempre a vertente associativa que mais longe levou o nome da nossa terra, a
ponto de, a determinada altura, ser uma das grandes fontes de rendimentos para
a sustentabilidade do mesmo Grupo. Em 1987, e porque se precipitavam algumas
incongruências e crispações em relação à modalidade, o responsável pela mesma,
Manuel Vaz da Silva, a conselho de algumas personalidades ligadas ao meio
desportivo federado, resolveu romper com o Grupo que havia ajudado a criar,
fundando o Centro de Atletismo de Mazarefes (CAM), com a empenhada colaboração
de outros aficionados, a saber: Manuel da Silva Liquito, Armando Afonso Forte,
José Napoleão Ferreira Ribeiro, Agostinho Dias Forte, João Paulo Dias Carvalho,
José Gomes Forte e António José Liquito da Torre. Não foi fácil esta ruptura
com o GACDM, levando a algumas incompreensões e até a empolgadas reacções
negativas por parte de quem se manteve fiel ao Grupo, ora órfão do atletismo.
Os ânimos exaltados foram-se apaziguando ao longo dos anos e todos foram
ganhando o seu espaço, conquistando as suas cumulações de honras e a
respeitarem-se mutuamente, fazendo transparecer a certeza de que tal percurso
foi o melhor que poderia ter acontecido para a nossa freguesia, porque se
duplicaram talentos, construíram-se novas infra-estruturas e promoveram-se
proximidades. Tal como na Grécia, essa mesma competitividade acabou por ser
palco de conversações e tratados de importância geral para todos nós e para a
terra que nos viu nascer, e que a alguns soube acolher. Compreendemos
perfeitamente as palavras de Manuel Vaz da Silva, aquando das comemorações do
vigésimo quinto aniversário do Centro de Atletismo de Mazarefes (27 de Outubro
de 2012), a propósito das dúvidas suscitadas pelos mais incrédulos, na
tentativa de menosprezar o trabalho levado a cabo ao longo destas duas décadas
e meia, relevando-as para o caminho percorrido em detrimento da desconstrução
de uns poucos, que nada fizeram pela freguesia e muito menos pelo atletismo, em
especial.
Hoje o atletismo em
Mazarefes goza de boa saúde, porque há uma excelente e saudável articulação com
as entidades oficiais, nomeadamente com a Câmara Municipal de Viana do Castelo,
Junta de Freguesia de Mazarefes, Associação de Atletismo de Viana do Castelo –
sendo que o CAM contribuiu de uma forma particular para a sua fundação –, e com
a Associação Social, Cultural e Desportiva da Casa do Povo de Mazarefes (saída
da fusão do Grupo de Acção Cultural e Desportiva de Mazarefes com a Casa do
Povo, da mesma freguesia). Fruto desta saudável articulação, Mazarefes dispõe
hoje de uma Pista de Atletismo, de uma excelente sede social e de um polidesportivo
sintético, há bem pouco tempo inaugurado.
Para terminar este
nosso “deambular” da pena e da mente, convém aqui salientar que o Centro de
Atletismo de Mazarefes tem no seu vastíssimo palmarés, desde campeões
distritais a campeões nacionais, quer a nível individual quer colectivo, e pelo
quarto ano consecutivo é considerado o clube do ano pela Associação de
Atletismo de Viana do Castelo, por ser um clube dos mais representativos, tanto
em número de atletas como em títulos conquistados. Como diria Manuel Vaz da Silva,
o atletismo existe em Mazarefes há trinta e sete anos – numa alusão clara ao
Grupo de Acção – e “por vezes digo que a nível distrital já ganhamos tudo que
havia para ganhar”. Diremos nós que, com este espírito colectivo, ganhou a
freguesia, a cidade e a região.
Parabéns ao Centro de Atletismo de Mazarefes e a todos aqueles que dão
corpo a projectos desta natureza!
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