Wednesday, February 01, 2006

Desertificação das Cidades

“Com menos de dez habitantes, o Rossio, em Lisboa, é cada vez mais uma praça pública de ninguém, resultado da ocupação pelo comércio de quase todos os andares dos moradores ao longo dos anos”.

Agência «Lusa»

A desertificação das pequenas e grandes cidades!...

Quando devíamos estar a debater o gravíssimo problema da desertificação das pequenas e grandes cidades, eis que a preocupação dos agentes comerciais vai no sentido de apontarem o dedo à proliferação das grandes superfícies. Embora faça sentido, essa preocupação tem sido, também dissimulada alguma apatia ao fenómeno da cidade desabitada para que se venha a justificar o injustificável. Já uma vez o escrevemos (1991) que a vila de Ponte de Lima faz repensar Viana, não apontando, na altura, os factores circunstanciais que levariam a tal “afirmativo despautério” do nosso subconsciente. De facto, ao fim de semana, a vila de António Feijó, de Norton de Matos e do Cardeal Saraiva continua a fervilhar de gente, dando sinais de uma inter-relação afectiva entre o comércio e o cidadão. Em terras de Ponte, sempre houve a preocupação de combater a desertificação, por forma a se estabelecer essa inter-relação. Os estabelecimentos de restauração – e similares – entendem e cultivam esta ancestral prática (quase familiar) de, no mesmo local do comércio, se reservar o primeiro andar ou divisões confinantes ao rés-do-chão, para habitação.


Pegou a moda de nas pequenas e grandes cidades transformarem todos os espaços disponíveis e habitáveis, em grandes centros comerciais, onde proliferam, de uma forma desordenada – face ao desequilíbrio de forças –, agências bancárias, “prontos-a-vestir” e outras tantas superficialidades, que em nada são convidativas à permanência ou à afectividade do cidadão, já que os residentes há muito que se transferiram para os arredores da cidade, sendo as suas anteriores residências transformadas em escritórios de advogados, laboratórios e outras coisas tais... Queixam-se os comerciantes e queixam-se os cidadãos. Em Viana, por exemplo, já foi normalidade viver sobre o tecto ou paredes-meias com um qualquer estabelecimento comercial, cujos proprietários se queixam, hoje, dessa desenfreada desertificação. Associado a este desânimo vem a insegurança. Deixou-se de ouvir este ou aquele pequeno barulho e o alarme quando dispara, já os “amigos do alheio” estão a fazer contas à vida, bem longe do centro nevrálgico dos malogrados “visitados”. Ninguém ouviu, ou se ouviram disfarçam sorrateiramente e dizem-se “moradores noutro bairro”. Ir ao café era morar ali ao lado!
Ponte de Lima tem sido para nós ponto de encontro, no terreiro ou no pátio, a fervilhar de gente. Bem ao centro da Vila, muitos são os nossos amigos que moram por cima de agências bancárias, cafés ou “prontos-a-ventir”. Uma simbiose perfeita, quando se reflecte nas consequências de decisões irreflectidas. O lucro de hoje, muitas vezes é o prejuízo de amanhã!
Vivemos um tempo em que as grandes superfícies começam a proliferar nos arredores das cidades, bem perto das actuais residências dos cidadãos. Será que ainda não deram por isso?

2 comments:

Anonymous said...

Execelente visão. Vê-se claramente a dimensão da sua clarividência. Os políticos deviam ler com atenção e sairem dos gabinetes. O ar condicionado faz-lhes mal à (in)consciência. Parabéns! Continue desalinhado, para bem de todos nós!
Elisa

Anonymous said...

Será que ninguém se apercebeu que os políticos estão a destruir as nossas cidades. Gostei da sua visão. Continue a escrever, para bem de todos nós.
José Fernandes