Tuesday, August 31, 2021

No centenário da morte de João da Rocha [1921-2021]

«Foi poeta na nobre e elegante acepção da palavra. Foi escritor com grande variedade de aptidões, de entre as quais se não deve olvidar a têmpera espontânea e forte do jornalista, ferindo todas as notas que podem convencer ou emocionar as pessoas que leem. E até falando – coisa em que poucos reparavam –, ele encontrava sempre a fórmula sábia e eloquente que exprime, através das claridades da estratificação verbal, conceitos profundos e acertados

(António José d’Almeida, Presidente da República – 1919-1923)   

Sábado, 19 de Junho de 2021, teve lugar na Sala Couto Viana da Biblioteca Municipal de Viana do Castelo, de forma afetiva e por obrigação, o Colóquio Comemorativo do Centenário da Morte de JOÃO DA ROCHA (1921-2021), ressuscitando-o sob o lema: LITERATURA, HISTÓRIA E INTERVENÇÃO CÍVICA, numa organização do Dr. António José Barroso (Agrupamento de Escolas de Abelheira de Viana do Castelo); Prof. Doutor Manuel Curado (Instituto de Letras e Ciências Humanas da Universidade do Minho); e Dr. Rui A. Faria Viana, enquanto Chefe de Divisão da Biblioteca Municipal de Viana do Castelo, entidade promotora (a par com a Câmara Municipal) deste mais que oportuno evento comemorativo. Por aqui perpassaram as seguintes comunicações: “João da Rocha como Historiador das Descobertas” pelo Professor Doutor João Oliveira e Costa (FCSH da Universidade Nova de Lisboa); “Quatro publicações periódicas dirigidas por João da Rocha” pelo Dr. António José Barroso (AEA de Viana do Castelo); “João da Rocha ou a discreta aliança entre Cultura e Civismo” pelo Professor Doutor Artur Anselmo (FCSH da Universidade Nova de Lisboa e Presidente da Academia de Ciências de Lisboa); “João da Rocha como Filósofo: Limites do Positivismo e Cosmologia Metafísica” pelo Professor Doutor Manuel Curado (ILCH da Universidade do Minho); e “O destino de João da Rocha” pelo Dr. Joaquim Domingues (AE Sá de Miranda, Braga). A nossa modesta contribuição foi dada no «2.º Painel: Espiritualidade e Literatura», tendo como moderador o Dr. António Pimenta de Castro, e onde ladeamos a Dra. Cláudia Costa (Doutoranda ILCH da Universidade do Minho), com a comunicação “Abraços Invisíveis: A Ciência do Espírito em João da Rocha e no Visconde de Figanière”; e o Professor Doutor José Carlos Seabra Pereira (Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra), com a comunicação “João da Rocha e «a sede do que nos foge»”, onde falamos sobre a “Biblioteca e Obra de João da Rocha”.

Com as iniciais e indubitáveis palavras de António José d’Almeida, ao tempo Presidente da República, do qual João da Rocha fora seu secretário particular até se finar na noite de 31 de Janeiro para 1 de Fevereiro, de há 100 anos que ora comemoramos: «Quando ocupei um lugar da mais alta responsabilidade política, ele esteve em constante e íntimo convívio comigo, e, se mais não teve, acompanhando-me até ao fim de uma jornada acidentada e tantas vezes tumultuosa, foi porque a morte o surpreendeu, fulminando-o. É certo, porém, que, durante os meses que trabalhou comigo, apreciei de conhecimento directo as excelências do seu espírito, que era consistente e fulgurante, e, a um tempo, rígido e maleável.» – iniciamos a nossa comunicação, sob a égide da «Biblioteca e Obra de João da Rocha (1868-1921)».

Estava definida a personalidade de João da Rocha que, por virtude da sua modéstia, falava pouco, sabia ouvir, mercê da atenção de Vicente Almeida d’Eça pelas qualidades tão raras naquele tempo, extensivas aos nossos dias, em que “tanto se fala… e muitas vezes tão pouco se acerta…” – Aplicação ao estudo, modéstia e primorosa cortesia. Raul Brandão, por exemplo, acolitava no elogio, perante a figura desse homem modesto e apagado, “de olhos explodindo azul como duas granadas”, que os seus amigos conheciam pelo nome de Frei. Perante o seu féretro, Raul Brandão, interroga-o: «De que te serviu viveres uma existência de estudo e de trabalho? Desapareceste quase sem ninguém dar por ti. Sabias tudo – e ignoraste o principal. Triunfaram e exibiram-se os que não valiam o pó dos teus sapatos, e tu recolheste à sombra dos livros para magicares num sonho inútil. Foste um homem modesto, o que é um erro que se paga muito caro. Quem sabe, sabe; quem pode, pode, e é sempre uma tolice deixar os outros subirem e mostrarem-se, passando-nos adiante quando o lugar nos pertence

Dizem as crónicas à época que João da Rocha nunca podia ser um bom militar. Era artista e erudito. Cláudio Basto, seu confidente e admirador, profundo conhecedor da sua personalidade e obra, revela-nos que “o seu anseio era a soledade contemplativa, meditar, sonhar; o seu trabalho gostoso era o estudo e a investigação. A vida era-lhe agradável entre livros e documentos ou entre árvores e flores.”

Infelizmente, tudo o que se possa recolher sobre o que João da Rocha escreveu, está longe de retratar o escritor, tendo em conta que os trabalhos impressos estão longe de representar a sua produção literária. Deixou trabalhos manuscritos, uns completos e outros incompletos, e deixou, espalhada por jornais, revistas e números-únicos, vastíssima colaboração. Disso nos dá conta Cláudio Basto: «Necessário é reunir tudo isso, carinhosamente, – e, depois de tudo isso publicado com método, é que se verá quem foi João da Rocha e o que ele viria a ser, se a morte o não fulmina precisamente quando o seu cérebro prometia entrar na fase do mais perfeito labor

Temos de referir ainda o facto de, infelizmente, boa parte dos seus trabalhos se perdeu, – uns porque ele os não arquivou, outros porque, após a sua morte, se extraviaram.

A Biblioteca de João da Rocha, adquirida pela Câmara Municipal de Viana do Castelo, a 2 de Abril de 1922, na arrematação judicial, por 20.182$00 (vinte mil cento e oitenta e dois escudos), composta de um incunábulo, 5.725 obras completas e 183 incompletas em 466 volumes, além de 65 lotes de revistas científicas e literárias, é muito variada, nela havendo obras dos mais diversos ramos científicos e das mais diversas literaturas. Como escreveu Cláudio Basto, em 1929: «Era Biblioteca de artista e estudioso ávido de saber de tudo, na qual se acumulavam não só livros de especialidades a que João da Rocha se dedicava como ainda outros de especialidades que ninguém esperaria ver ali tão representadas

Nestas extraordinárias jornadas científicas, que contaram com a presença do Presidente da Câmara, Eng.º José Maria Costa, foi ainda apresentado o livro “A Sabedoria da Paciência: antologia do centenário de João da Rocha (1868-1921), de Manuel Curado, pela Dra. Cláudia Costa (ILCH/ Universidade do Minho) e pelo Professor Doutor José Eduardo Franco (Universidade Aberta).

Por isso, também por obrigação, compete-nos exaltar tão nobre iniciativa!

(In, Amanhecer das Neves, N.º 352, Agosto de 2021, p. 20)

Monday, April 27, 2020

DIA INTERNACIONAL DA LÍNGUA PORTUGUESA



Por decisão tomada o ano passado, em 17 de Outubro de 2019 (quinta-feira), pelo conselho executivo da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), foi deliberado que o Dia Internacional da Língua Portuguesa passava a ser comemorado anualmente a 5 de Maio, como já vinha acontecendo na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Na altura, todos os países lusófonos se uniram para introduzir esta significativa proposta, mas receberam o apoio de países como Argentina, Geórgia, Luxemburgo ou mesmo Uruguai, tendo a mesma proposta sido aprovada por unanimidade.
Na proposta apresentada ao conselho executivo, «os países lusófonos argumentaram que a língua portuguesa é a mais falada do hemisfério Sul e que foi também a língua da primeira vaga de globalização, deixando palavras e marcas noutras línguas no mundo.»
Para além do Dia Internacional da Língua Portuguesa ser oficialmente assinalado na sede da UNESCO, com apresentações musicais, literatura, exposições ou outra iniciativa cultural, a sua organização ficará a cargo dos países que têm o português como língua oficial.
Na senda desta importante data e da defesa da língua portuguesa, a União de Freguesias de Aldoar, Foz do Douro e Nevolgide (Porto), numa iniciativa intitulada «FOZ LITERÁRIA» irá assinalar o 5 de Maio de 2020, com CICLO DE ROTEIROS E CONFERÊNCIAS. «E se também falássemos português? Não seria nada mau, não… Com um Dia especialmente dedicado a celebrar a nossa Língua, bom seria que nos lembrássemos dela e nos esforçássemos mais por falar como ela deve ser falada…» – citamos do cartaz. Parabéns pela iniciativa!

Thursday, February 06, 2020

Faleceu o Médico Psiquiatra Tibúrcio Angosto Saura


Foi com o mais profundo pesar que recebemos a triste notícia, através da organização e comissão científica (Sociedade de História Interdisciplinar de Saúde [SHIS], nas pessoas dos Professores Doutores Ana Leonor Pereira, João Rui Pita, José Morgado Pereira e Victoria Bell) do «Congresso Internacional de História da Loucura, Psiquiatria e Saúde Mental», que todos os anos se realiza no mês de Maio em Coimbra, do falecimento do Médico Psiquiatra, nosso prezado amigo, conselheiro, inesquecível companheiro de Jornadas e Congressos Internacionais, Doutor TIBÚRCIO ANGOSTO SAURA. Partilhando do mesmo sentimento da Comissão Científica, lembramos hoje o Doutor Tibúrcio Saura não só pela sua competência científica e profissional mas também o seu enorme sentido de solidariedade, a sua amizade por todos nós. Em especial à sua família e a todos os colegas que com ele privavam diariamente os nossos sentidos pêsames.


Thursday, January 03, 2019

IMPERATIVOS DA MEMÓRIA (V)


Em memória das palavras e do povo!…

«A nossa irreverência construtiva tem tomado sempre como base a perfeição e o bem-estar deste povo mártir. É nisto que consiste tanta atenção e tanto envolvimento de zelo e compostura. Neste deslumbramento, nunca pretendemos ser panegiristas ou a fina flor desta terra em termos de superioridade...»

Laurestim Rodrigues Fernandes


Escreveríamos em jeito de prefácio à mais recente obra de Laurestim Rodrigues Fernandes, «DEM, MINHA TERRA, MEU AMOR: ANTOLOGIA DOS NOTÁVEIS», que essa era a nossa maneira mais justa de retribuirmos o sentido da procura em fazermos amizade com as pessoas que são superiores no carácter e na ética, inteligentes e sábias, conferindo-lhe, ao mesmo tempo, a forma e a acção confuciana de evitar aquelas que são licenciosas, faladoras e fúteis. Aqui, a justiça das nossas palavras foram no sentido da virtude platónica e da justiça cívica em Aristóteles como uma “disposição para realizar acções que produzem e conservam a felicidade, e os elementos desta, para uma comunidade política”. É aí que se situa a maneira de SER e de ESTAR em Laurestim Rodrigues Fernandes: pela justiça correctiva, que respeita às transacções entre indivíduos e que se conforma com o princípio de igualdade; e pela justiça distributiva que aplica o princípio de proporcionalidade na repartição das vantagens e das honras em função dos méritos de cada um.


O momento vivido e sentido nas cerimónias de encerramento das comemorações das Bodas de Ouro (1968-2018) da criação da freguesia de Dem, pelo Decreto-Lei n.º 48590, de 26 de Setembro de 1968, até então lugar, agregado às freguesias de Orbacém e Gondar, onde houvera nascido Laurestim Rorigues Fernandes, a 8 de Junho de 1942, não poderia ter melhor exaltação comemorativa do que o legado por si deixado através desta sua prazerosa obra, expressão viva deste Homem de bem – enquanto aquilo que é útil à realização de um fim superior –, de carácter e eticamente bem formado, que bem cedo, nas suas quinze e dezassete translações, depois de conseguido o diploma da 4.ª classe com distinção – que, tendo em conta o rigor dos exames, só mais dois ou três o conseguiram –, bem demonstrativo da sua determinação e tendência para os estudos e progresso do seu rincão, e deambulante por terras alfacinhas, já defendia, a letra de imprensa, os interesses do povo e da terra que o viu nascer, nomeadamente nos “Diário de Notícias”, “Primeiro de Janeiro” e “Comércio do Porto”, onde defendeu intransigentemente a população de Dem, em vários assuntos, que ora, dado o seu esmero e determinação, sem regatear esforços ou sacrifícios (e foram muitos), pouco importa referir nestas poucas linhas, a que estamos condicionados.
A «Dem: Minha Terra, Meu Amor…», acresce a necessidade, vincada e vigorosa, de manifestar o seu amor à Terra que o viu nascer e crescer (Antologia dos Notáveis), com a certeza, como ele mesmo expressa, de jurar com fidelidade e um espírito de convicção extrema, seguir a rota, indiferente a tudo, desbravando caminhos inóspitos e correndo riscos que pareciam intransponíveis – corroboramos das suas palavras. Só assim podemos definir Laurestim Rodrigues Fernandes: humilde, discreto, compreensivo, singular, mas corajoso e audaz no processo de desenvolvimento das causas em que acredita e defende, porque imanente do humanismo e ética, em si, enquanto SER constituinte, suporte de atribuição dos predicados assentes na fé, esperança e coragem construtiva. Condução preconizada a favor do Povo que merece a felicidade e o progresso pelo qual sempre tanto e tanto lutou… disse.
Nota máxima!

Friday, September 21, 2018

OS DEZ ESPELHOS de BENJAMIN ZARCO, novo romance de Richard Zimler.

Leitura obrigatória de Richard Zimler, através do seu último romance Os dez espelhos de Benjamin Zarco (Porto: Porto Editora, 1.ª edição: setembro de 2018; tradução de Daniela Carvalhal Garcia do título original The Incandescent Threads. DEP. LEGAL 444946/18; ISBN 978-972-03129-7).



Sinopse:
«Benjamin Zarco e o seu primo Shelly foram os únicos membros da família a escapar ao Holocausto. Cada à sua maneira, ambos carregam o fardo de ter sobrevivido a todos os outros.
Benjamin recusa-se a falar do passado, procurando as respostas na cabala, que estuda com avidez, em busca daquilo a que chama os fios invisíveis que tudo ligam. E Shelly refugia-se numa hipersexualidade, seu único subterfúgio para calar os fantasmas que o atormentam.
Construído como um mosaico e dividido em seis peças, Os dez espelhos de Benjamin Zarco entretecem-se entre 1944, com a história de Ewa Armbruster, professora de piano cristã que arrisca a vida para esconder Benni em sua casa, e 2018, com o testemunho do filho de Benjamin acerca do manuscrito de Berequias Zarco, herança do pai, talvez a chave para compreender a razão por que Benjamin e Shelly se salvaram e o vínculo único que os une.
Um romance profundamente comovente e redentor, com personagens inesquecíveis. Uma ode à solidariedade, ao heroísmo e ao tipo de amor capaz de ultrapassar todas as barreiras, temporais e geográficas.»

Notas sobre o autor e a sua obra:
·         Richard Zimler, com cinzel e escopro, vai burilando com audácia criativa a dimensão intangível de um universo onírico. (Edite Estrela sobre O Evangelho segundo Lázaro)
·         Richard Zimler é um escritor emblemático e de indispensável leitura. (Helena Vasconcelos)
·         Richard Zimler tem um fulgor de génio que todos os romancistas ambicionam mas poucos alcançam. (The Independent)
·         O dom que Zimler possui de pôr a descoberto o horror das injustiças humanas e ainda assim encontrar verdades universais e poesia na existência do dia a dia […] faz dos seus livros uma leitura indispensável. (The Jerusalem Post)
·         Zimler usa a literatura para lembrar as terríveis abominações que levam o ser humano a destruir e a humilhar outros seres humanos […] e para apontar um caminho de redenção, de expiação e de ação jubilatória. (Público)