Friday, July 29, 2016

«Luzes de muito brilho» em Cláudio Lima!...

«Ginzo do Lima, a raiana,
Da Galiza amena aldeia,
Onde o rio principia
A sua vida serrana,
O nome deu ao mortal
Que, longe da penedia,
Vem morrer, beijando a areia
Às praias de Portugal…»

António Ferreira

À parte de alguns devaneios menos comedidos no “acto solene” da apresentação do mais recente livro de Cláudio Lima, «Luzes de muito brilho: Figuras e temas limianos», para os quais em nada podemos assacar a este magnífico escritor e poeta, temperamos a nossa circunstancial indisposição (Ó maldita hérnia-discal!) com a certeza que se “nuestros hermanos” fechassem o caudal do Lima – tamponando-o a conta-gotas –, a partir da Barca e até à foz estaríamos a beber da água do Vez e, na ponta final, quiçá, da Ribeira de S. Simão da Junqueira de Mazarefes, que foi Couto com posse acrescida em Terras de Paradela, banhadas pelo mesmo rio que nos viu nascer, apesar de a partir das três translações passarmos a beber água do “Bengo”.


Devaneios nossos também à parte, jamais nos deixaremos condicionar por imperativos de acantonamento, principalmente quando os escritores, ao atingirem determinado patamar, se extravasam para lá da condição de “meninos do rio”. Esse é o caso de Cláudio Lima, o menino Manuel da Silva Alves, de Calvelo, que cedo se aventurou por outras paragens até atingir a maturidade intelectual e prosperidade na adversidade, resignando-a. E se Montapert o disse que «o homem é corpo, intelecto, espírito, e tudo isso deve evoluir paralelamente para uma vida bem-sucedida e equilibrada», Cláudio Lima, porque não vive da ociosidade, já há muito que se libertou da ferrugem que consume mais que o trabalho. Isto, se tivermos em linha de conta que a ociosidade é como a ferrugem. Tal como um dia escreveu José Hermano Saraiva, «uma chave de que todos os dias nos servimos, anda sempre limpa e polida», Cláudio Lima é essa chave que, a par de outras, não necessita de rotulações maiores para ser um dos maiores entre os maiores. Sancta simplicitas!
Falando agora do «LUZES DE MUITO BRILHO: Figuras e Temas Limianos», estaremos em dizer que temos entre mãos mais uma magnífica – estético-literariamente falando – obra de Cláudio Lima. Ainda que o seu conteúdo seja o resultado da recolha de uma série de pequenos textos de ensaio ou intervenção, proferidos e/ou publicados “em vários momentos e afectos a várias celebrações, tendo por nexo estrutural o simples facto de abordarem temáticas limianas. Como configuram uma sequência dos trabalhos coligidos em Um rio de muitas luzes (2005) confiro-lhes agora um título de feição sequencial: Luzes de muito brilho.” – citamos de “breve nota” do autor.


A metáfora da LUZ, com capa (extensiva à contracapa) extraordinariamente bem conseguida, do grande artista da imagem Amândio Sousa Vieira, confere-lhe o lado místico ou metafísico, à boa maneira platonista: «o Bem está para a inteligência e para o inteligível, no mundo da realidade inteligível, como o sol para a vista e para o visível, no mundo da realidade visível» (República, 508c). As alegorias da linha e da caverna convergem no aprofundamento da metáfora da LUZ, sendo que em Cláudio Lima funciona como fonte ou factor de conhecimento, de memória e de expressão (ou manifestação escrita) da verdade. Preferimos a “Luz de muito brilho” à metáfora dos “faróis” em Baudelaire.
Apesar de Vasco Rodrigues de Calvelo, Domingos Tarrozo, António Feijó, Campos Monteiro, Queiroz Ribeiro, João Marcos, António Manuel Couto Viana, Luís de Sousa Dantas, entre outros, serem os faróis que brilham acima do tempo e que continuarão eternamente sendo objecto de admiração, de estudo e de inspiração para todos os artistas, Cláudio Lima imprime-lhes uma Luz própria, peculiar até, num ritmo alucinante e uma linguagem profundamente melodiosa. Sim, concordamos com expressão de “autor imparável”, e ainda que nos tornemos repetitivos no decalque, fazemos nossas as palavras escritas de Maria de Lourdes Brandão: «Cláudio Lima escreve com o coração. O acaso fez com que nascesse em Ponte de Lima. É português, nortenho, limiano até à medula, um homem fortemente ligado às suas raízes…». Plenamente de acordo. A sedução, a nostalgia, o amor profundo à terra que nos viu nascer e aos vultos que lhe dão corpo, palpitam e eternizam-se, através da saudável (porque bem construída) escrita de Cláudio Lima. «Faça-se a luz!» E a luz foi feita (2 Cor. 4, 6). Venham outras tantas luzes de muito brilho.
        NOTA MÁXIMA!

Saturday, July 23, 2016

Isabel Baraona expõe em Viana do Castelo!...

«As linhas, os nós, os fios, de Isabel Baraona que reflectem a fugacidade do movimento e do momento e acentuam a fixidez daquele movimento e daquele momento…»

Maria José Guerreiro

Isabel Baraona, nascida em Cascais em 1974, é licenciada em Pintura pela ENSAV-La Cambre (Bruxelas) e doutorada em Belas Artes pela Universidade Politécnica de Valência, Espanha, com uma tese sobre a diferenciação entre auto-retrato e auto-representação no século XX. Em 2013, no âmbito de um pós-doutoramento, foi bolseira da Universidade Rennes 2 (França) onde desenvolveu uma investigação que deu origem ao projecto Tipo.pt, um arquivo online sobre livros de artista e edição de autor em Portugal; sendo ainda co-editora de Portuguese Small Press Yearbook uma edição anual sobre o assunto. Nesse mesmo ano fez uma residência na Columbia College em Chicago, ao abrigo de uma colaboração informal e intermitente com o JAB – Journal of Artists’ Books desde 2011.
Em 2001 iniciou o seu percurso profissional com uma exposição individual intitulada mythologies tendo participado em diversas exposições individuais e colectivas, em Portugal e no estrangeiro.


É, desde 2011, uma das organizadoras de “o que um livro pode”, encontros anuais à volta dos livros de artista e edição de autor.
Rui A. Faria Viana, Chefe de Divisão da Biblioteca e do Arquivo Municipais de Viana do Castelo, responsável pelo projecto que há três anos tem evidenciado pela sua coerência e, também, pela sua consistência, tratando-se já da sétima edição, e se reflecte não só na estrutura das exposições como também nos próprios catálogos, começou por salientar o facto deste mesmo projecto se ter iniciado na Biblioteca Municipal, na Ala Jorge Amado, em Maio de 2013, com a exposição “diários de sombras” de Tiago Manuel (director artístico do mesmo projecto), seguindo-se em Janeiro de 2014 com a exposição “domador de imagens” de João Fazenda, em Julho do mesmo ano, com “desenhos atrás do espelho” de André Carrilho, em Janeiro de 2015 com “história natural com parafusos” de Luís Manuel Gaspar, em Julho com Cristina Valadas e a mostra designada “vida desenhada à mão”, em homenagem a Luísa Dacosta, em Janeiro deste ano com João Vaz de Carvalho e a exposição “ver com o desejo”, inaugurando-se no pretérito sábado, 16 de Julho, a exposição “a mão que desenha escreve a palavra” de Isabel Baraona, que se prolongará até ao dia 31 de Dezembro do corrente ano.


Tal como afirmou Tiago Manuel, exposições desta natureza revestem-se de um trabalho preciso para os professores e alunos, uma forma de aproximar os artistas das pessoas, estabelecendo o contraditório de quando se fala de Arte pensar-se logo nos museus, e olhar para os artistas como pessoas distantes, quando eles estão verdadeiramente ligados ao quotidiano. Referiu ainda que em Isabel Baraona há uma cartografia do corpo como liberdade, aspectos conceptuais que definem o artista. Em Isabel Baraona cada desenho é assertivo, tendo em conta que há gente dentro de cada desenho. Nela é uma indisciplina, uma violência e uma provocação.
Pedro Moura, a quem Isabel Baraona se referiu com carinho e profunda afectividade, considera-a uma artista egoísta, qual tom provocatório para desempoeirar o “direitinho dos alinhados”: «O egoísmo a que nos referimos não é o de Isabel Baraona, a pessoa, que apenas diz respeito a quem com ela conviverá, começando pela própria. É a da obra, e o seu nome enquanto metonímia dela. E esta exposição estende, pela sua diversidade circunstancial, um traço concreto dessa presença a que chamo “egoísta”, pois como a palavra quer na sua origem etimológica mostra-se uma perspectiva que parte de uma visão particular, ancorada num prazer pessoal…» – citamos e corroboramos na sua plenitude.
De facto, e seguindo o raciocínio lógico de Pedro Moura, também nós descobrimos que, nesse egoísmo de prática, o resultado é o convite de uma partilha. Não apenas dos desenhos, mas desses mesmos actos de travessia. E que no dizer de Maria José Guerreiro, “o gesto que se acentua, a linha que se aflora ou o risco que se sulca. E todo o nosso corpo se projecta nesse fio imaginário”. A obediência de Isabel Baraona ao comportamento próprio dos materiais que emprega... Uma exposição e uma artista que se recomendam.
A realçar ainda a presença afectiva, na inauguração da exposição «a mão que desenha escreve a palavra (obra gráfica editada em livros, jornais e revistas)», do escritor e seu particular amigo Valter Hugo Mãe.
       NOTA MÁXIMA!

Monday, July 11, 2016

Isabel e Guilherme Valadão: Angola revisitada em escrita de qualidade!...

«Ao cair da noite, os sons vindos da floresta eram mais vivos e tornaram-se quase ensurdecedores nalguns pontos do caminho. E conseguia distinguir alguns deles, como o latido dos cães e o uivar quase constante das hienas e, estranhamente, os de um batuque distante, rompendo a noite…»

Guilherme Valadão

Toda a gente sabe (ou devia saber) que Angola representa para nós um alicerce saudável na construção da nossa personalidade e sensibilidade inteligível, sem equívoco dos sentidos. E é nesse sentido (com os devidos pedidos de desculpa para a redundância) que nos aventuramos na leitura compulsiva, em tudo o que diga respeito à Angola da nossa infância e juventude, espaço temporal de gratas memórias, onde fizemos parte da paisagem; subimos às mangueiras, cajueiros, abacateiros; vimos pilar a mandioca, colher o café, chorar cantando ao som do batuque, porque acreditavam na vida para além da morte; talhar o marfim, pau-rosa e pau-preto (…). Aí nasceram nossos irmãos. Vimo-los crescer e com eles crescemos. Essa é a mística e a descompressão que ora nos vem pela leitura.
Hoje falar-vos-emos de dois escritores, que recomendamos vivamente, porque se nos oferece a condição objectiva para a dedução transcendental: Isabel Valadão nasceu na pequena vila de Paço de Arcos (Lisboa) mas, em 1951, com a idade de seis anos, foi para Angola, aí tendo vivido até 1975, pouco antes deste país se tornar independente. Acompanhando os pais no seu périplo angolano, passou por diversas regiões, desde Lobito a Malange, até se fixarem em Luanda, cidade onde viveu a adolescência, casou e onde nasceram as suas duas filhas – Margarida, nascida em 1968 e Teresa, em 1974. Durante alguns anos, foi analista química dos Serviços de Geologia e Minas em Luanda e secretária da revista angolana Notícias. Regressou a Portugal em 1976, depois de uma breve passagem pela África do Sul, onde a sua família se refugiou na sequência dos graves acontecimentos que antecederam a independência de Angola. Viveu em Macau, regressando definitivamente a Portugal em 1986. Cascais foi o local escolhido para se fixar e aí viveu durante mais de trinta anos. Licenciou-se em História da Arte na Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa. Em privado, dedicou-se à investigação na área da Defesa e Conservação do Património, paralelamente à conservação e restauro de pintura. Como faz questão de dizer, vive na região saloia de Mafra, na companhia do marido (Guilherme Valadão), nove gatos e uma doce golden retriever chamada Daisy. Publicou, sob a chancela da Bertrand: Loanda – Escravas, Donas e Senhoras (2011); A Sombra do Imbondeiro – Estórias e Memórias de África (2012); Angola – As Ricas-Donas (2014).


Guilherme Valadão nasceu em Angola em 1940, por lá fez a sua formação escolar, passando pelo Liceu Salvador Corrêa de Sá, em Luanda, e pelo Colégio dos Irmãos Maristas, em Silva Porto. Fez a sua vida profissional a partir de Luanda, viajando em trabalho por todo o território e por vários países da África Austral, durante vários anos. Em 1966 casou com a Isabel de quem teve as duas filhas. Em 1975, pouco antes da Independência daquele território, e na iminência de ser preso pelo MPLA devido à sua proximidade pessoal a Joaquim Pinto de Andrade, refugiou-se na África do Sul onde foi acolhido pela Philips como auditor interno. Em 1977 chegou a Portugal com a família, onde se estabeleceu como mediador de negócios imobiliários. Passados dois anos, encerrou a empresa e foi viver para Macau os dez anos seguintes, estabelecendo-se com negócios ligados a obras públicas, representações e comércio. E nessa actividade viria a conhecer algumas regiões da China, incluindo Hong Kong, Cantão e Xangai, entre outras. Publicou, também sob a chancela da Bertrand, Era Uma Vez em Angola (2015), uma gota de água do que tem escrito ao longo dos últimos doze anos, entre prosa e poesia, e guardado. Este livro tem o mérito naquilo que a nossa Angola empresta a todos os seus filhos no esplendor da sua História, no feitiço das suas gentes e no encanto da sua geografia – conta a pequena odisseia de um miúdo zangado com o mundo, que atravessa o território em todos os sentidos, e em muitos povos se integra como qualquer outra criança a viver nas mesmas circunstâncias. Tal como um dia nos confidenciou Guilherme Valadão: «Ao longo das mais de setecentas páginas do livro completo, que vai de 1912 até ao ano da Independência, em 1974, conto a minha história e a da minha família até ao dia que fui obrigado a abandonar a terra onde nasci. Para trás ficavam as memórias e nos cemitérios os ascendentes dessa criança problemática, que se fez homem, por lá viveu os anos da guerra e os conflitos próprios da história dos povos. Por razões editoriais a parte publicada com este livro é apenas dos primeiros três ou quatro capítulos do manuscrito…».
Que dizer, então, da escrita de Isabel e Guilherme Valadão? Tão simples como isto: Literatura com alma. Forma nostálgica de respeito, neutralidade e, sobretudo, honestidade intelectual. É um sentir da africanidade, envolto por estórias e viagens enfatizadas pelo misterioso e maravilhoso, sem dissimulações ou leituras evasivas, feitas pelo ressoar dos tambores (batuques), dos quissanjes ou marimbas; manhãs de intenso nevoeiro na partida para o degredo; gente ruidosa à chegada, em subúrbios da cidade baixa, qual bairro “Ingombota” das quintandeiras, oleiros, pedreiros, sapateiros, latoeiros, contrastando com o cenário do bairro dos Coqueiros, no sopé da Fortaleza do Morro, que de Jesuítas se vestia; dos purgantes para limpeza dos intestinos; os acontecimentos automobilísticos; os lugares emblemáticos dessa Luanda das acácias em flor: a Livraria Lello, as pastelarias Paris, Versailles e Arcádia, os gelados do Baleizão, etc., etc… Conhecê-los será a próxima etapa de releitura, de estórias tão próximas das nossas, que, por certo, se fundirão com a história da nossa Angola e das suas gentes. Nem que seja através do «Era uma vez...», decalcado pelo sentir e pelo cheiro, vida sentimental, busca da felicidade, entre fidalgos, traficantes, degredados, escravos e “libertos”, donas e senhoras, sem esquecer o sagrado imbondeiro, árvore da sabedoria e vida, em paraíso onde nos era permitido proibir o proibido. De norte a sul do território, olhando para trás, escutando ruídos e vivendo, sentindo. Conversas intermináveis; “mata-bicho” e refeições condimentadas pelo charuto aceso e saboreado; abrindo caminhos pelas picadas em direcção às sanzalas, temendo cipaios; viagens mágicas, por sítios onde as águas dos rios e oceanos eram mansas e cristalinas, e o “céu era de um azul profundo e, lá ao longe, a uma grande distância daquele ponto, era já da cor do fogo porque o sol mergulhava naquele oceano distante”. Contrastes e memórias aguareladas, marcadamente saudáveis: «O meu filho nasceu hoje…». Terra onde tudo pegava de estaca!   
Nestes livros, lidos e relidos, será exigível os autógrafos, porque gostamos. A arte e a leitura pelo gosto, sem fretes, será sempre a única forma, nossa, de trocarmos horas de tédio pela alegria de permanecermos neste planeta. Esse será sempre o nosso “kukala kiambote ó kíua” e a única forma de nos libertarmos deste “psoríaco” obscurantismo, agarrando na palma das mãos a cor do fogo, de um sol diferente, tropicalmente diferente.
        NOTA MÁXIMA!

Friday, July 01, 2016

«Para lá de Bagdad» com Alberto S. Santos!...

«O espectáculo não poderia ser mais extraordinário. As ânforas, jarros e tinas de fogo grego apanharam os bersekeres e os ferozes guerreiros khazares que escalavam a muralha, ou se mantinham nas suas imediações totalmente de surpresa. Agoniavam, às dezenas, centenas, milhares, como diabos ardentes ambulantes, no meio de gritos lancinantes…»

Alberto S. Santos

Alberto S. Santos, escritor e político português, de seu nome completo Alberto Fernando da Silva Santos, nascido em Paço de Sousa, Penafiel, em 1967, esteve presentemente na Biblioteca Municipal de Viana do Castelo, para estar à conversa connosco. Licenciado em Direito pela Universidade Católica Portuguesa, exerceu a Advocacia até 2001, altura em que passou a desempenhar funções autárquicas, como Presidente da Câmara Municipal de Penafiel até 2013, tendo antes sido vereador da mesma Câmara Municipal de 1993 a 1997, e membro da Assembleia Municipal, de 1997 a 2001.
Actualmente, para além de ter retomado a advocacia, é Presidente da Assembleia Municipal de Penafiel, Presidente da Assembleia Intermunicipal da Comunidade Intermunicipal do Tâmega e Sousa (CIM-TS) e Membro do Conselho da Administração da APDL (Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo).
Enquanto escritor, de salientar a publicação de quatro romances: A Escrava de Córdova (2008), editado também em Espanha e Países da América Latina, A Profecia de Istambul (2010); O Segredo de Compostela (2013); e Para lá de Bagdad (2016).


Apaixonado pelos livros e pela investigação histórica, comissário do prestigiado evento literário «Escritaria», Alberto S. Santos, para além de ter sido durante doze anos Presidente da Câmara Municipal de Penafiel, tem-se dedicado, ao longo da última década, à escrita. Para lá de Bagdad, com atrás referimos, é o seu quarto romance histórico, obra que traduz uma extraordinária envolvência sobre um dos momentos mais intrigantes da História da Idade Média, que dá a conhecer os alicerces de uma civilização ainda hoje tão deslumbrante quanto desconhecida. Segundo o historiador e romancista, João Pedro Marques, ler esta obra é ir das ruas de Bagdad às estepes do Volga, viajar do centro do mundo sedentário até à orla das terras nómadas, e fazê-lo com a dose de aventura, exotismo e suspense a que os romances de Alberto S. Santos já nos habituaram.
Tal como um dia disse Alberto S. Santos, e de certa forma o reforçou no «À conversa com…» do pretérito dia 24 de Junho, o facto de estudar o passado ajuda-o a compreende melhor o presente e a estar melhor situado no tempo em que vive. Essa é uma das vantagens, a vantagem de estudar e investigar o nosso passado comum ajudando-o a essa melhor compreensão e também permitir-lhe que através das histórias que conta, os leitores possam fazer também eles esse percurso e essa análise. Afirma também que nas suas investigações encontra muitas vezes personagens que o ajudam a compreender muitas pessoas que conhece hoje no presente. Lembra-se que quando estudava algumas cortes, nos palácios, mesmo nos islâmicos, nomeadamente em Córdova, para a escrita do seu primeiro livro, havia as figuras dos bajuladores oficiais. Chegou mesmo a ironizar: – Muitas vezes vejo pessoas que me fazem lembrá-los.


Para lá de Bagdad foi o mote para estarmos «À conversa com…» Alberto S Santos, naquela inesquecível noite de sexta-feira, 24 de Junho de 2016, na Sala Couto Viana da Biblioteca Municipal de Viana do Castelo, nosso espaço refúgio para um saudável contacto com os livros e seus autores. Nomeadamente daqueles que mais gostamos, sendo que Alberto S. Santos é, entre outros, um deles. Este seu quarto romance discorre magnificamente através de uma escrita escorreita, fortemente suada, porque assente em investigação meticulosa (fazendo transparecer na escrita e no diálogo/debate), recheada de uma dose, quanto baste, de aventura, exotismo e suspense. De facto, «sábio é o verdadeiro viajante que se move pelo mundo, capaz de descobrir todas as suas faces». Olhar o mundo através dos olhos Ahmad, quiçá de Alberto S. Santos, atravessando pontes e alcançando portas, muitas vezes escancaradas ao livre-arbítrio ou a filosóficas alegorias: «Não pareciam afectados com a derrota nem com a razia provocada pela batalha entre o grupo de viquingues. Os que sobreviveram poderiam continuar a festa durante o tempo de vida que lhes sobrava, enquanto os que foram mortos em combate estariam ainda mais honrados e felizes».
Assim é a viagem de Ahmad ibn Fadlan, emissário do califa, que parte de Bagdad para uma arriscada missão na Bulgária do Volga, na Rússia actual. Enigma para o autor, a causa-efeito que levaria Ahmad a deixar para trás os mestres e companheiros da Casa da Sabedoria, que erguerem a época dourada do Islão: «Ahmad recordou aos amigos as palavras do tio Nadir: um dos mais belos momentos da vida de um homem é o da partida para uma viagem distante, quando nos libertamos da rotina, da escravidão, do hábito e dos medos que nos oprimem; é como começar uma nova infância que nos plantará sementes de imaginação, de memória e de uma nova esperança…». Etapas, emoções, espelho, estado cognitivo-criativo do autor? Quiçá!
Final arrebatador: – Sim, uma mulher. Fala muito mal a nossa língua. Diz que veio de um país distante do Norte e traz um bebé que ela diz ser teu filho. Chama-se Astrud, conheces?!... Um livro e um autor que se recomendam, porque resultado de sementes de imaginação, de memória e de uma nova esperança, mesmo quando os sábios continuam a ser perseguidos e os livros queimados na “praça”.
        NOTA MÁXIMA!