Saturday, September 29, 2012

Ritual da Dedicação da «Igreja da Sagrada Família»: o maior templo físico do Alto Minho.


“Cada um de nós está neste mundo como um templo. Eu quero ser este templo habitado por Deus, este espaço sagrado porque quero ser pedra viva da Igreja, da Comunidade. Que cada um desta comunidade se envolva numa dinâmica de comunhão, como sendo, a seu modo, pedra viva que faz este novo Templo”.

Pe. Artur Coutinho

Tal como aconteceu com Étienne Gilson (1884-1978) – filósofo e historiador da filosofia, exegeta da Bíblia e da filosofia da Idade Média –, também nós nos questionamos permanentemente, quando nos posicionados na ponte entre «Deus e a Filosofia», tema que deu título a uma das inúmeras obras publicadas por este já desaparecido filósofo, que chegou a guiar-nos através da evolução das doutrinas filosóficas sobre Deus, considerando este aspecto – a ponte entre Deus e a Filosofia – como o maior de todos os problemas metafísicos. Abordou temas como o problema das causas finais, talvez o problema mais habitualmente discutido pelos agnósticos modernos; o problema do “SER” e por que há alguma coisa em vez de nada (Leibniz); a hostilidade manifestada por uma ciência inteiramente matematizada em relação ao acto irredutível da existência; a aniquilação do mundo material por Deus, sem afectar de modo algum o nosso conhecimento científico dele; a questão da atribuição de uma propriedade misteriosa chamada “existência”; o valor do argumento na base do desígnio; o conceito estrutural de existência; e, finalmente, o facto de que, para Étienne Gilson, “toda e qualquer energia existencial, toda e qualquer coisa que exista depende, para existir, de um puro Acto de existência”.


Mas, não foi com este “desígnio”, de nos mantermos na ponte questionável entre Deus e a Filosofia, que resolvemos aceitar o convite do Pe. Artur Coutinho (nosso parente por afinidade) para assistirmos à Cerimónia de Dedicação da Igreja da Sagrada Família, templo esse que passa a ser o maior do Alto Minho, com capacidade para 1400 pessoas, pensado para funcionar com um serviço de «babysitting», com salas insonorizadas. Neste tão semblante acto ritual, moveu-nos tão só – como se mais não bastasse – o espírito de solidariedade e de partilha, comungando, ao mesmo tempo, das palavras do nosso grande amigo e conterrâneo, Pe. Artur Coutinho: “Aqui, neste edifício dedicado à Sagrada Família, hoje e sempre, quero escutar, saborear em Comunidade a Palavra de Deus, comungar e vivê-la no dia-a-dia da minha vida”.


Sem mais palavras, e apesar de compreendermos alguma apreensão por parte de pessoas exteriores à dinâmica da paróquia – visualizadores do estado físico (quando se fala da obra avaliada em cerca de três milhões de euros), sem interiorizarem aquilo que não é explicável, mas que impulsiona a chamada “fé” de milhares de pessoas –, apenas nos apraz registar a multifuncionalidade de tão importante empreendimento, que inclui um espaço para acolhimento temporário de crianças abandonadas e um centro de dia (já em funcionamento há mais de quatro anos), ficando a faltar a conclusão das valências dedicadas a projectos educativos e recreativos. Saliente-se o facto de que os avultados custos foram totalmente suportados pelos paroquianos de Nossa Senhora de Fátima, com contributo de amigos, sacerdotes e bispos da região, sendo que o único investimento externo foi o terreno, atribuído pela Câmara Municipal de Viana do Castelo, com a condição de servir também para a realização de actividades sociais e culturais. E isso, também já tem vindo a acontecer.


Registe-se apenas algumas curiosidades, tomando por deferência as palavras de agradecimentos do Pe. Artur Coutinho, que ajudam a desmistificar alguma detracção em tempo de crise: “a todos os paroquianos e amigos, e a todo o povo de Deus desta Paróquia, exemplo de fé e generosidade, que com as suas dádivas, trabalho e entusiasmo foram um decisivo contributo para a realização duma obra que enobrece e prestigia esta Comunidade”; “aos arquitectos Faro Viana (autor do projecto e responsável numa primeira fase) e Sebastião Meireles que numa fase posterior o concluiu; à empresa Pormin pela elaboração dos projectos gerais e específicos; ao gabinete do Eng.º Jorge Torres que fiscalizou e acompanhou a obra; às empresas de construção Aurélio Martins Sobreiro e Habitilima, seus gerentes e todos os trabalhadores que puseram de pé o templo”, etc., etc. Ainda segundo o Pe. Artur Coutinho, ilustre pároco de Nossa Senhora de Fátima (coincidência ou não, é cidadão de mérito de Viana do Castelo), a concretização deste projecto contribuiu para o reforço da “coesão, da solidariedade e da participação” dos fiéis, ao mesmo tempo que “arrasta consigo um apelo à mudança interior”.

Para terminar, esperamos, sinceramente, que o templo exterior (físico), ora inaugurado, se matize na força da pura razão natural, a emergência de um caudal de vida que culmine no homem. Aí, estaremos cá para aplaudir!

Friday, September 07, 2012

«Biologia como ideologia: a doutrina do ADN» em Richard Charles Lewontin


Por se tratar de um tema tão actual, e porque continuamos de volta da nossa impreterível (porque necessária ao nosso consciente) investigação a propósito do “Eugenismo em Portugal” (nossa décima terceira obra a publicar, mas primeira de cariz científico), resolvemos partilhar convosco a leitura e interpretação – em jeito de recensão crítica, muito pessoal – de Richard Charles Lewontin, filósofo da ciência, no que concerne à sua obra «Biologia como ideologia: a doutrina do ADN», publicada em 1998, pela editora “Relógio d’Água”. Esta obra é baseada nas conferências Massey de 1990, com o mesmo título, transmitidas em Novembro desse mesmo ano, como parte da série “Ideias”, da rádio CBC. Por ser considerado o pensador evolucionista mais influente e um dos biólogos mais celebrado da actualidade, não admira que esta reflexão acabe por reflectir, como se pode ler em sinopse, o seu pendor de análise dos falsos caminhos pelos quais a ideologia científica moderna nos conduziu. E começaremos por dizer que para Richard Lewontin a ciência, à semelhança de outras actividades produtivas, como o Estado, a família, o desporto, apresenta-se-nos como uma instituição social completamente integrada e influenciada pela estrutura das outras instituições sociais. Ao apresentar-se como uma instituição social, a ciência define-se, assim, por um conjunto de métodos, de pessoas, um corpo de conhecimentos a que chamamos científicos, mas está separada do quotidiano de cada um e/ou das forças que governam a estrutura da própria sociedade. Os resultados científicos são influenciados por predisposições derivadas da sociedade em que vivemos. Para reforçar esta ideia, temos de ter em conta que os cientistas estão imersos numa família, num Estado, numa estrutura produtiva, e esse assumir científico é moldado pela sua experiência social.

Ainda segundo Richard Lewontin, a ciência desempenha duas funções: a primeira assenta na manipulação do mundo material, que se revela na construção de um conjunto de técnicas, práticas e invenções, produzindo coisas novas e transformando as nossas vidas; a segunda é a função de esclarecimento. Esta função relaciona-se muitas vezes com a primeira (manipulação do mundo material). Se por um lado os investigadores transformam o modo material da nossa existência, por outro, procuram constantemente explicar porque é que as coisas são da forma como são. Trata-se, no fundo, da afirmação que estas teorias acerca do mundo devem ser produzidas com a finalidade de transformar o mundo através da prática. Assim, face à sua adaptabilidade, a ciência pode substituir a religião – e mais não adiantaremos, para não ferir susceptibilidades –, enquanto principal força legitimadora na sociedade moderna. Outro factor relevante nesta obra é que Lewontin afirma que os seres vivos serão determinados, em primeiro lugar, por factores internos: os genes. Estes serão determinantes para a aptidão individual na resolução de problemas durante a existência e garantia da matriz de cada um na futura descendência. Os genes estão na determinação individual, como os indivíduos na determinação das colectividades. A estrutura social passa a ser o resultado do conjunto de comportamentos individuais. Se os genes fazem os indivíduos e estes fazem a sociedade, logo, os genes fazem a sociedade. Por outro lado, os desafios colocados pela ideologia científica moderna exigem uma nova teorização da natureza humana. Vemos que os problemas da saúde e da doença são localizados no indivíduo, tornando-se este num problema para a sociedade, em vez de ser aquela a tornar-se um problema para o indivíduo. É este peregrinar que assente em relações económicas simples, encobertas como factos da natureza, orienta e condiciona toda a investigação biológica e tecnológica nos tempos contemporâneos.
Perante a questão se “estará tudo nos genes (?)”, Lewontin confronta-nos com a contradição entre a igualdade pretendida pela nossa sociedade e a observação de que grandes desigualdades existem. E para refutar a objecção a uma sociedade desigual, tem sido desenvolvida uma teoria biológica da natureza humana, defensora da ideia segundo a qual existem certas semelhanças congénitas entre todos nós na medida em que as nossas diferenças estão codificadas nos genes. Assim, surge a ideologia do determinismo biológico: que nós nos diferenciamos em capacidades fundamentais devido a diferenças inatas, que tais diferenças inatas são herdadas biologicamente, e que a natureza humana garante a formação de uma sociedade hierárquica. Contudo, o autor refuta esta ideia quando afirma que não temos nenhuma razão a priori para pensar, por exemplo, que existe diferenciação genética entre grupos raciais no que respeita a características como o comportamento, o temperamento a inteligência. E, também, não existe qualquer prova de que as classes sociais se distinguem nos seus genes, excepto na medida em que a origem étnica ou raça – não gostamos do termo, dado que para nós só existe uma raça… a humana – possam ser usadas como forma de descriminação económica. Chega mesmo a ser um contra-senso, quando os ideólogos do determinismo biológico afirmam que as classes mais baixas são biologicamente inferiores às classes superiores (para nós, puro conceito eugénico). A seu ver, a biologia moderna é caracterizada por um grande número de preconceitos ideológicos. Um dos principais preconceitos prende-se com a natureza das causas, visão que se torna mais evidente nas nossas teorias acerca da saúde e da doença.
Richard Lewontin alerta-nos para o facto da crença na importância da nossa herança na determinação da saúde e da doença ser o projecto sequencial do genoma humano, que assenta num programa de muitos biliões de dólares e que mobiliza biólogos americanos e europeus. No fundo, torna-se num grande consumidor de dinheiros públicos. Por isso, as causas – primárias e secundárias – não se remetem apenas ao âmbito científico, dado que os aspectos sociais, culturais, políticos e económicos têm influência na própria vida. A noção empobrecedora de causalidade que caracteriza a ideologia biológica moderna – uma noção que, segundo ele, confunde agentes com causas – conduz-nos segundo direcções muito determinadas na procura de soluções para os nossos problemas. Daí, a afirmação, ainda que questionável, de tantos biólogos poderosos, famosos, bem-sucedidos e extremamente inteligentes quererem construir uma sequência do genoma humano. Tal comprometimento advém de eles estarem tão inteiramente dedicados à ideologia das causas unitárias simples que acreditam na eficácia da investigação. Contudo, a resposta é bastante mais comprometedora, tendo em conta que a participação e o controlo de um projecto de investigação de muitos biliões de dólares, que poderá durar cerca de meio século, e que irá envolver o trabalho diário de milhares de técnicos e de investigadores de baixo nível, é, segundo Lewontin, uma perspectiva extraordinariamente atraente para um biólogo ambicioso. As investigações começam a ser realizadas com base nos lucros das mesmas. Advinha-se assim o alerta do autor para o perigo das ideologias científicas que regem a nossa vida.
Contextualizando, do ponto de vista histórico, a afirmação popular de que toda a existência humana é controlada pelo nosso ADN, Richard Leowtin afirma que tal convicção tem o efeito de legitimar as estruturas da sociedade na qual vivemos, porque não destrói a tese segundo a qual as diferenças no temperamento, aptidão, saúde física e mental estão codificadas nos nossos genes. Acrescenta ainda que tal afirmação também defende que as estruturas políticas da sociedade são igualmente determinadas pelo nosso ADN e que são, por conseguinte, imutáveis. A tese central é que toda a filosofia política tem de começar por uma teoria da natureza humana e o problema central para os pensadores da filosofia política tem sido sempre o de tentarem justificar a sua visão particular da natureza humana. Tomando como exemplo aquilo que Thomas Hobbes chamou de «guerra de todos contra todos», pois concluiria que todos precisávamos de um monarca para impedir que tal guerra conduzisse à destruição total, Lewontin afirma que a «guerra de todos contra todos» transformou-se na luta das moléculas do ADN pela supremacia. Para Leowtin, a forma mais moderna de ideologia naturalista da natureza humana é a Sociobiologia – teoria evolucionista e genética –, a última e a mais mistificadora tentativa para convencer as pessoas de que a vida humana é muito mais do que tem sido e talvez até mais do que deve ser. A Sociobiologia aparece aos olhos do autor não como uma simples disciplina, mas uma forma de pensar que se impõe dentro de outras áreas, para além da biologia. Nesta insere-se a teoria da natureza humana que faz compreender a sociedade hierárquica, competitiva e empreendedora dos tempos modernos.
No último capítulo, Richard Lewontin sintetiza que tudo o que somos, a nossa doença e saúde, a nossa pobreza e riqueza, e mesmo a estrutura da sociedade em que vivemos, estão, em última estância, codificados no nosso ADN. Refere a visão individualista do mundo biológico, caracterizando-a como simples expressão das ideologias fecundadas pelas revoluções burguesas do séc. XVIII, que colocam o indivíduo no centro de tudo.
À visão que a biologia moderna sustenta, na qual os organismos não passam de campos de batalha onde combatem forças externas e forças internas e ultrapassando a concepção da adaptabilidade da vida pela visão construtiva, contrapõe que os organismos constroem realmente o seu ambiente independentemente das zonas do mundo, sendo, pois, o ambiente dos organismos codificados no ADN.
Por fim, pela nossa “leitura” apraz-nos em dizer que a organização política e social é um reflexo do nosso ser biológico. E é a consciência que cria o nosso ambiente, a sua história e a direcção do seu futuro. Tal facto proporciona-nos uma compreensão correcta da relação entre os nossos genes e a forma das nossas vidas.
Um livro aconselhável, porque não, a políticos também!

Wednesday, September 05, 2012

RESPEITO PELAS TRADIÇÕES? O anúncio português censurado


Depois da publicação da "reflexão sobre a «Ética Animal» em Peter Singer e Tom Regan" que fizemos no Jornal Cardeal Saraiva (Ponte de Lima), Ano 102, N.º 4447, 31 de Agosto de 2012, p. 17 e 19, e também aqui no nosso blogue, aqui fica um pequeno anúncio português censurado, levando a que nunca fosse passado na TV. Vá lá saber-se por quê!... E se falássemos dos "torneios medievais", das "lutas de gladiadores", do "sacrifício do filho primogénito", etc., etc.