Thursday, April 30, 2015

Mário Rocha retratado por um «Retrato de uma vida»!...

«Conheci o Mário como me parece que ele gosta de conhecer os outros: à mesa e com dois copos de vinho, um petisco e muita conversa para adivinhar. Eu sabia do pintor que transpunha a imaginação para a tela e do eremita ocasional que teimava em levar o mundo para a serra. Ouvi-o, ele ouviu-me, brindamos e trocamos convicções. Ficamos amigos.»

Luís Miguel da Silva Mendonça Alves
(Presidente do Município de Caminha)

Há muito que devíamos esta referência ao pintor Mário Rocha, tendo Perre como a terra que o viu nascer (1954) e onde diz que o habituou a uma sobrecarga de emoções “e o caminho que procurei para as transmitir foi através da expressão plástica”, dado que há mais de três décadas que somos amigos, numa assumida cumplicidade e abnegada lealdade, cimentada pelos alicerces da Cultura.
Tomando por base o excelente álbum em bilingue (português e inglês), dado á estampa em Julho de 2014, com o apelativo título «Mário Rocha: Retrato de uma vida», forçosamente nos colocamos na obrigação de escrever duas linhas acerca desta maravilhosa obra, onde são reproduzidas mais de duas centenas das suas obras, que passam por acrílico sobre tela, lona, papel, cartão e madeira; óleo sobre tela; painel e placa em cerâmica e madeira sobreposta; grés; ferro e cerâmica. Para além disso, muitos são os testemunhos, nos quais nos incluímos (ou fomos incluídos), dados, porque vivenciados e partilhados: Luís Miguel da Silva Mendonça Alves, Isabel Pires de Lima, Daniel Campelo, Amilcar Acácio Malhó, Pedro Abrunhosa, Miguel Urbano Rodrigues, André Santos Fidalgo Martins, Toy (músico), Gonçalo Fagundes Meira, José Fanha, Rico Sequeira, Carlos Oliveira, Gil do Carmo, Rui Teixeira, Elmiro de Sousa, Vitória Guilherme, Nuno Cardoso, António Inverno e nós.

Mário Rocha

Esta magnífica “obra-álbum”, com duzentas e quarenta páginas, termina com uma relação dos artistas participantes na “Arte na Leira” nos anos de 2000 a 2013, biografia de Mário Rocha (a Arte na Leira e Mário Rocha) e uma bem elabora cronologia das exposições em que participou, colectiva e individualmente.
Por muito já termos escrito sobre o Mário Rocha, não resistimos à tentação de aqui reproduzirmos o testemunho por nós deixado, ainda que imerecidamente, neste, já por nós adjectivado, magnífico álbum, comemorativo dos dezasseis anos da “Arte na Leira” e quarenta como Artista: «Quando um dia nos motivamos pela máxima de Montapert em que “o objectivo mais elevado da cultura intelectual é dar ao homem um conhecimento e domínio de si próprio”, cedo nos apercebemos que a vida só faz sentido quando nos envolvemos na criação artística como causa efeito da nossa sensibilidade… a Arte!
É através da expressão artística que a nossa identidade ganha forma, porque uma obra de arte não é só uma ideia: é uma ideia realizada.


Mário Rocha, um sensitivo nato, a expressão viva da Arte Realizada, sonhou um dia partilhar a sua causa efeito com o seu, nosso, meio, fazendo jus a uma máxima de um poeta universalista que nos proporciona a sensibilidade da arte pela arte, e não da arte pelo homem.
Arga de Baixo, Casa do Marco, refúgio do Pintor Poeta, onde o granito beija o chão aprazível e virgem da urze, onde vale a pena respirar o ar da cultura e o céu se mistura com a simplicidade do povo serrano, puro e castiço, é todos os anos convergente identidade e carácter da expressão artística de dezenas de artistas.
Tal como um dia sentimos e escrevemos, Mário Rocha esboçou a paisagem em pinceladas multicolores, dando-nos a conhecer a arte, a arte que sabe e deve viver em simbiose com o bravio da terra e dos homens desse “Deus Maior” e omnipotente porque alma da natureza.
Todos os anos, a expressão “Arte na Leira”, bem perto do povo, com a alma pregada ao escarpado da serra, como quem bebe inspiração no tempo e para lá do tempo.
Hoje e sempre pela Arte, os trilhos empedrados, ladeados por muros de pedra solta. As casas humildes, os moinhos e as presas, regras na rega, o milho, o feijão, o centeio, a aveia, a ancestralidade, marcada pelas tradições, pelo querer e pela fé. Os rebanhos, cada cabeça com o seu nome, obediente às ordens do pastor. O granito e o xisto, os ribeiros, salpicados de azevinhos, as fontes, ditas milagreiras, os sobreiros, os carvalhos, os castanheiros, os louros, as faias e as giestas. Os lobos, os coelhos bravos, as raposas, as perdizes e o javali. A imponência, a aridez e a grandiosidade da Serra. O pôr-do-sol e o luar. As concertinas, o cantar ao desafio. As lendas e a história, com os seus castros, conventos e templos, na Leira.»
         Parabéns Mário Rocha!

Monday, April 27, 2015

«Corre!» de Casimiro Teixeira apresentado em Viana do Castelo!...



«Naquela terra, como provavelmente em todas as de que há memória, e consoante a forte existência de meninos, carteiros e ademais amantes de velocípedes, haveria de existir sempre um homem como o Sr. Cícero.»

Miro Teixeira

Depois de termos feito uma pequena “nota opinativa” acerca da novela «Corre!», de Casimiro Teixeira, estávamos longe de imaginar que tal “atrevimento” levar-nos-ia à dupla responsabilidade de fazermos a sua apresentação pública, em Viana do Castelo.
De uma leitura, inicialmente apressada, passamos à degustação das palavras escritas do Miro Teixeira, o outro lado do espelho do Casimiro, com o intuito de lhe esmiuçarmos algo mais que pudesse acrescentar ao pequeno texto, colocado na “aba” da contracapa do livro que ora iria apresentar: «Um escritor, para se assumir como tal, tem que ser um observador nato e saber transmitir, sem recurso à imagem, os verdadeiros cenários físicos e psicológicos da vida, caracterizando as personagens e desvendando intimidades. Os verdadeiros escritores sabem dar testemunho das suas mundividências, sem subterfúgios laboratoriais, muitas vezes carunchados por aquilo que deveras sentem. Miro Teixeira é um escritor autêntico, porque cumpre a sua missão, enquanto observador e tecelão da escrita.» Esta nossa impressão, com as devidas desculpas pela redundância, e como anteriormente referimos, acabou por ser impressa na “aba”, fazendo-nos cumpridores de uma etapa para a qual se nos impunha apenas falarmos do autor e da sua forma de escrita. Apresentar a novela seria outra coisa.


No dia da apresentação, condicionados pelo estado negativo do torpor da morte do nosso amigo e excelso escritor Luís Miguel Rocha (1976-2015), ainda ponderamos ficar mesmo pela primeira impressão, por forma a não influenciarmos os hipotéticos leitores, libertando-os de condicionalismos de interpretação, quase sempre subjectiva. Mas, ao sermos convidados para o fazermos, mesmo que condicionados por essa subjectividade, não seria justo se não nos estendêssemos um pouco mais no desvelar do principal enigma de poder alguém um dia morrer, sem nunca ter vivido ou conhecido o amor, qual paralelo estigma com o passamento do Luís Miguel.
É evidente que ninguém estaria à espera do desvendar de todo o trama “novelo-literário” do Miro Teixeira, dado que aí arriscaríamos ao promíscuo abuso de diminuirmos o interesse dos leitores, pela aquisição da obra, quando a principal “causa-efeito” da nossa presença ia no sentido contrário. Mesmo assim, não resistimos à tentação de volatearmos um pouco sobre o riquíssimo “puzzle-lexical” desta estranha história de amor e morte anunciada, protagonizada por um personagem tão insólito que se arrisca a ser demasiado real para acreditarmos que poderá mesmo existir ao nosso lado – citamos da sinopse.
Neste “correr” de Miro Teixeira perpassam “bastiões de eterno retiro”; “coca-bichinhos” que vivem em boas assoalhadas; margarinas barradas “até à exaustão”, em dias normais; senhoras que levam “a mão ao cabelo, num segundo, mais discreto, ajeita o oscilar do seio dentro da blusa”; revoltas “contra a condição humana”; bancos humedecidos pela geada da manhã; fugas à rotina; mesas iluminadas “pela luz cálida do mar em frente”; sardinhas assadas “na brasa, como prato do dia”; dissipações das “cores da vergonha do rosto”, toldando-se “com um semblante de serenidade”; doenças e desistências “da pressa que a morte lhe encomendou”; sorrisos gelados; sonhos “em atravessar mares e descobrir novos continentes”; naufrágios reais em pleno oceano, alegoricamente plasmados na “refém náufraga de uma vida soturna e só”; olhares de esguelha “numa impaciência crescente, porque começava a acreditar que havia exagerado na explosão de liberdade”; corações padecentes, ofegantes, “mais um momento e parecia que do seu peito iria irromper uma torrente imparável de ar contido à força, rasgando-lhe a carne e os ossos com a pressão” – se isto pode acontecer aos mais novos, quanto mais ao Humberto Crica, principal personagem deste «Corre!»; hereditariedade no “conhecer a fundo as suas partes de carne”, assente no milagre da genética, que já “vinha desde os tempos do seu trisavô, que era Crica sim, mas por ser afeito ao mulherio”; escuridões insidiosas que se apoderam dos pensamentos e não deixam em paz um só instante; caminhos abertos por entre a multidão, que muitas vezes nos evitam, como se de leprosos, nos tratássemos; cheiros a maresias; dicotómicas vivências entre uma fábrica de leite e uma oficina de reparações; o vestir do “fatinho surrado de algodão no meio do inverno alentejano”: – Já estou vendo, esse seu ar de canito assustado vai dizendo tudo. Vá… abale daqui copito de lete dum raio. Não vales um chocalho d’erva. Simplesmente magnífico, diremos nós.


E mais não diremos, a não ser o facto de acrescentarmos o lado estético da obra, enquanto produto final, primorosamente editada pela “Versbrava” e a Arte a ela associada, com as ilustrações de Helder Sanhudo, uma outra forma de complementaridade sem ofuscar a criatividade literária de Casimiro Teixeira, este homem nortenho de gema, e amante profundo das suas raízes, sobretudo da cidade que o viu nascer, Vila do Conde. Helder Sanhudo ao fazê-lo, fê-lo com o sentido estético da literatura precisar sempre de um estímulo, como forma de nos levar a ler. E esse estímulo pode passar, também, pela imagem. A imagem não é literal, de explicar o que está no conteúdo, mas, antes, funciona como um parceiro.
        Parabéns a todos, e de uma forma particular ao Casimiro Teixeira!

Friday, April 17, 2015

Conferência Internacional «New Renaissance in Europe» leva-nos a reinterpretar património cultural!...

«O imenso património cultural deixado pelo Renascimento na Europa é reconhecido internacionalmente como uma marca da Europa para o mundo. Esse património é um dos pilares fundamentais da identidade e da consciência colectiva europeia.»

RenEu: New Renaissance in Europa

No dia 24 de Março de 2015, tendo como palco a Casa das Artes, da cidade Invicta, participamos na Conferência Internacional «RenEU: New Renaissance in Europe», no âmbito do projecto homónimo, coordenado pela Região da Toscana, Itália, em parceria estratégica com outras quatro instituições – Patronato de la Alhambra y Generalife (Espanha), Associação Villa Decius (Polónia), Mision Val de Loire (França) – e promovido em Portugal, também como parceiro, pela SETEPÉS em parceria com a Direcção Regional da Cultura do Norte (DRCN), com o intuito de resgatar os fundamentos necessários para a reflexão e construção de um novo processo cultural – um novo renascimento – que se alastre por toda a Europa e reforce o sentimento de pertença e a consciência de futuro conjuntos dos Europeus.


A manhã foi preenchida pela apresentação do projecto, com especial destaque para o itinerário português, “Monastery of Serra do Pilar: A Window on Europe”, sendo que o Mosteiro da Serra do Pilar, parte do Centro Histórico do Porto Património Mundial da Humanidade UNESCO, foi o local escolhido para acolher o itinerário português do projecto pelas suas características renascentistas únicas na região e na Europa. Ficamos com a sensação, principalmente quando vivemos um período marcado pela descrença no futuro e insatisfação com o presente, que o mesmo projecto vai no sentido de se revisitar e reinterpretar o Renascimento à luz da sua dimensão Europeia, principal propósito do projecto e da conferência.
Estaremos nós, cidadãos Europeus, a fazer o melhor uso deste recurso? – A pergunta ficou no ar.
Assente em ideias do Renascimento com a transposição para a Europa contemporânea, ouvimos Pedro Galera Andreu, Historiador de Arte e Professor Catedrático da Universidade de Jaén, falar do renascimento europeu como o nascimento do mundo moderno, perspectivando um modo de pensar mediante a observação, através das técnicas de perspectiva da Arte, nas perspectivas de representação; representação do homem como «microcosmo» contendo em sua perfeita proporção da escala maior do Universo; ordem arquitectónicos clássicos ajustados à variedade de género; o mundo antigo, exemplo de harmonia entre as Ciências e as Letras; a ânsia do conhecimento, reforçando a ideia das bibliotecas como novos templos do saber; a Europa como centro, periferia e migração de homens e ideias; principais centros artísticos; a influência de Maquiavel no modelo de Estado dos reis católicos; passando pelo pintor português Francisco da Holanda, que ao viajar para Itália acabou por escrever um Tratado sobre Artes Plásticas “Da Pintura Antiga” (1548), e dos mestres d’obras portugueses que trabalharam em Espanha.


O segundo orador da manhã, Gian Bruno Ravenni, Director Regional de Cultura – Região da Toscana, apresentou a ideia de fazer a proposta de uma iluminação para a Europa, recordando os autores da Renascença, não como um passado morto. No fundo, a ideia europeia com as suas tradições do passado, abrindo-as a novas filosofias com fins antropológicos. Reforçou, ainda, o objectivo da ideia da migração intelectual, através dos pensamentos autónomos e originais, referindo-se, também ele, a Maquiavel; o fenómeno da Europa “RenEU”, assente num novo programa «Europa Criativa» e no debate sobre a Renascença, como base da nossa cultura europeia comum. Em suma, para Gian Ravenni, a metodologia tem sido fazer a ponte, através do debate, entre a Renascença e a Europa Contemporânea, ligando-a a cinco espaços físicos, lugares únicos, cidades únicas, patrimónios únicos – itinerários culturais: Florença (Itália), Granada (Espanha), Krakon (Poland), Porto (Portugal) e Loire Valley (França).
Susana Abreu, arquitecta e investigadora na Universidade do Porto, fez apresentação do Mosteiro da Serra do Pilar, enquanto monumento renascentista, como uma encruzilhada de saberes e sinal de mudança, e Elvira Rebelo, Técnica Superior de História da Direcção Regional de Cultura do Norte, o Itinerário “Monastery of Serra do Pilar: A Window on Europe”, salientando ligações do projecto, pessoas, lugares, como objecto do humanismo renascentista e porta de entrada para o Património do Norte de Portugal. Para nós, enquanto debate, na nossa curta intervenção, apresentamos a nossa ideia dedutiva em “dez mandamentos patrimoniais”: 1 – Arquitectónico; 2 – Cultural (Pontes); 3 – Religioso (Teológico); 4 – Filosófico; 5- Itinerários; 6- Debate sobre o Renascimento numa transposição para a Europa Contemporânea; 7 – Migração de pessoas e ideias (Cultura Humanista do Renascimento); 8 – Corpo e Mente da Europa; 9 – Espaço monástico como uma visão do mundo, lugar de razão e de imaginação; 10 – Cosmopolitismo.  
A parte de tarde foi preenchida com um debate «No Rosto da Europa», no qual participaram Bem Schofield, Professor Universitário no King’s College London e Membro do Grupo Estratégico da A Soul for Europe; Rémi Deleplancque, Project Manager para a Educação e Cultura da Mission Val de Loire; Gian Bruno Ravenni e Elvira Rebelo, tendo como moderadora Susana Abreu. Algumas questões e conclusões importantes retivemos deste interessante debate: Como definir e quantificar o valor patrimonial; como podemos desenvolver esse património; a cultura vista como optativa e não essencial; a Europa a precisar de um paradigma de mudança; o Renascimento superou as eras obscuras, contudo, não sabemos o suficiente sobre o mesmo; o aspecto cultural e menos económico; o património como recurso, quando a cultura e o património já não estão nas políticas da Europa, levando-nos a que já não se possa entrar pela porta, mas sim pela janela; a construção de uma Cultura Europeia e não Nacional; construir propostas por toda a Europa, não sendo possível construir uma entidade estatal sem uma Nova Narrativa; a afectividade dos lugares e dos objectos, não se protege por decreto; a ética da hospitalidade; o Património e Cultura estão carregados de formas e de objectos, nada mais; problema do financiamento dos projectos, quando estão a cortar nas universidades, nas vertentes da ciência e da cultura; o acesso cultural é um projecto político e não tem passado apenas de um ideal, levando ao fracasso.
        Deduzimos, desta interessante Conferência Internacional, que o acesso ao Património e à Cultura apresentasse como um trabalho árduo, mas, infelizmente, obstruído por uma burocracia economicista, para o qual não se nos apresenta uma réstia de esperança. No entanto, continuamos a acreditar que “o património cultural pode e deve estar no centro do debate e da reflexão sobre a cidadania europeia e do projecto europeu”. Haja vontade, por parte dos políticos!

Tuesday, April 14, 2015

«In perpetuam rei memoriam»: no centenário do nascimento de Hermes Pimenta Gonçalves (1915-2015)!



 «O nosso pai é a figura central da história recente da nossa família. Homem de acção, moldou a vida familiar dentro dos princípios da integridade, do respeito e do amor. A sua preocupação com o nosso bem-estar e o da nossa mãe, levou-o a acompanhar de perto e a apoiar o nosso crescimento e adaptação à sociedade…»

Ortelina, Maria Fernanda, Maria Teresa e Ana Paula

Foi com a maior das satisfações que anuímos ao honroso convite do Olindo Ramos Maciel para participarmos na homenagem comemorativa do Centenário do Nascimento (1915-2015) do Grande Artista do Vale do Neiva, HERMES PIMENTA GONÇALVES, aquele HOMEM vertical, pautado por princípios éticos, assentes nos pilares da família e dos ancestrais valores da educação, da moral e da solidariedade. Conhecemos perfeitamente o SENHOR – título honorífico que lhe impomos à boa maneira britânica (SIR), já que, por cá, os “comendadorismos” de circunstância caíram na artificial banalidade, do ser pelo parecer – HERMES, dado que frequentamos a sua casa, o seu improvisado espaço criativo, as suas intimidades (onde misturamos actos de cumplicidade) e deu-nos guarida no seio da sua família. Jamais poderemos esquecer o reforço dos “estados de alma”, aquando das suas oitenta e muitas translações, à socapa das recomendações preventivas da família, se deslocou, sozinho, de noite, ao volante do seu carro, até à milenar Bracara Augusta, para assistir ao lançamento das nossas modestas e/ou banais deambulações literárias. A sua presença irradiava em nós uma espécie de protecção, qual anjo da guarda se mostrava vigilante, conselheiro e piedoso providente.


É evidente que não vamos recalcar, aqui e agora, a sua biografia física de espaços temporais (dado que, anteriormente, já o havíamos feito em apontamentos dispersos por vários jornais regionais), pois à dimensão cosmológico-intemporal em que se encontra, a sua biografia está nas suas obras e no testemunho que deixou impregnado em cada um de nós. Foram dezenas e dezenas os retratados ou caricaturados pela sua magnífica inspiração cognitivo-artística e destreza manual. Tivemos a felicidade de sermos um deles! 
 

Por isso, apesar de termos outro compromisso marcado para esse mesmo dia e mesma hora, incondicionalmente aceitamos o convite do Olindo Maciel, querendo desde já expressar-lhe os mais efusivos parabéns pela iniciativa. Comoveu-nos profundamente a romagem ao cemitério, com a colocação de uma coroa de flores, seguida do acto cerimonial da apresentação do livro de Olindo Maciel «Centenário do Nascimento Hermes Pimenta Gonçalves 1915-2015», com caricaturas do SENHOR HERMES, e abertura da respectiva exposição. Toque mágico, celestial, aquele, o de abertura e fecho com música clássica, através do violoncelo de uma jovem instrumentista, com pena nossa de não ter sido apresentada. Enquadramento perfeito, carregado por um extraordinário magnetismo. Ponte, energeticamente positiva.  
O jornal «Amanhecer das Neves» fez-se representar pelos seus dois “pesos pesados”, Manuel Moreira do Rego e Amadeu Silva, e pelo autor destas mal alinhavadas linhas, imbuídos pela velha máxima de que “só morre quem é esquecido”.
         Parabéns SENHOR HERMES pelo seu centésimo aniversário!