Tuesday, April 04, 2017

«P’ra que Viva Ponte de Lima! Terra de Tradições…» com e em Amândio Sousa Vieira!...



«Ninguém ama verdadeiramente aquilo que não conhece. A sabedoria dessa frase comum aplica-se também à área da Cultura, domínio muito vasto, complexo e evolutivo, alvo frequentemente de nefastas concepções equivocadas e de redutoras ideias-feitas...»

José Cândido de Oliveira Martins

Sem dissimulações, começaremos por dizer que o nosso particular amigo Amândio Sousa Vieira acaba de publicar, felizmente com a anuência do Município Ponte-limense, uma obra de grande fôlego. Não fosse a sua exacerbada modéstia, não estaríamos aqui a discorrer no sentido de parafrasear José Cândido Martins, ilustre docente da Universidade Católica Portuguesa, quando afirma por escrito – sim, as palavras ditas leva-as o vento –, tirando-nos as palavras da boca, por delas concordarmos e subscrevermos, que «estando profundamente enraizada no passado e na memória das gentes, essa opulenta e multifacetada tradição, que nos moldou antropológica e culturalmente, impõe dois desafios fundamentais: o do mais amplo conhecimento desse legado, que tende a desaparecer com a passagem das gerações e a fatídica erosão temporal; e o da valorização e salvaguarda desse património, através da adopção de iniciativas e políticas variadas, desde logo a nível local e autárquico…», terminando com a consciencialização da relevância do tema e do papel desempenhado por este ilustre limiano, de seu nome completo, Amândio Amorim de Sousa Vieira.


Quase que poderíamos ficar por aqui, não fosse a desedificada perturbação de alguns fazedores (tomando-nos de novo pelas palavras de José Cândido Martins) de “nefastas concepções equivocadas e de redutoras ideias-feitas”, mas a nossa percepção, porque equidistante da sensação e da intuição intelectual, obriga-nos a remover os engulhos dos pseudo-intelectuais e/ou serviçais de circunstância. Daí, para nós, a percepção assentar na apreensão directa de uma situação objectiva, suprimindo os actos intermédios: Amândio Sousa Vieira não é um fotógrafo mas um Artista da Imagem. Ponto final.
Falando agora da obra «P’RA QUE VIVA PONTE DE LIMA! TERRA DE TRADIÇÕES», começaremos pelo sentido estético, a experiência que comporta uma forma fácil de relacionarmos a imaginação e a acção do sujeito com o objecto, diremos que estamos perante uma obra perfeita. A partir daqui podemos ainda relacionar, como um dia escreveu o nosso amigo/filósofo italiano, Mario Perniola, a estética da vida e estética da forma (verdade estética e auto-referencialidade), se tivermos em linha de conta a vida e a acção cognitiva de Amândio Sousa Vieira, com a sua experiência, representação, síntese de sensações e pensamentos. Só assim, e tomando como referencial todas as suas obras anteriores, poderemos chegar a essa conclusão: o essencial da experiência estética é a objectivação (George Santayana).
Quanto ao conteúdo, porque de Tradições se trata, e, segundo este ilustre limiano, “P’ra Que Viva Ponte de Lima” é fundamental divulgar e defender tudo o que possa engrandecer a sua longa e rica história, o efeito do produto final acaba por reflectir a paixão, a interpretação, a seriedade e o percurso de uma vida pautada pelo sentido estético, atrás referido, e ético em Amândio Sousa Vieira – acrescentamos nós. Os agradecimentos, as referências e a extensa bibliografia atestam, só por si, o rigor científico, aliado à paixão, interpretação e seriedade, para lhe conferirmos o sentido ético, a boa maneira aristotélica, porque firmado na ciência prática tendo por assunto os actos do Homem enquanto Ser possuidor de razão, e por objectivo a virtude na condução da vida. E creiam-nos que não estamos a exagerar, quando falamos assim de Amândio Sousa Vieira, tendo em conta que nada devemos um ao outro.


Obra profusamente ilustrada com mais de 400 ilustrações, sendo que as fotografias actuais, nomeadamente as de a partir de 1980, são do autor. As mais antigas pertencem a vários arquivos, públicos e privados (assinalando as que foi possível), fazendo questão de salientar que todos os desenhos, pinturas e gravuras estão devidamente identificados, razão pela qual aludimos à seriedade intelectual e gratidão de Amândio Sousa Vieira, principalmente quando se refere, para além das pessoas e instituições citadas em “Agradecimentos”, a Joana Caçador e Mariana Quintela, pelo precioso contributo dado a esta magnífica obra.
Poderíamos embarcar na veleidade de reduzir a nossa apreciação à já recalcada teorização, quase sempre injusta e desajustada, de que tudo isto nasceu de um embrionário hobby ou mero passatempo de recolhas avulso, quando sabemos não ser bem assim. Pelo menos, e tendo a noção de que o inato e o adquirido parecem estar interdependentes (não fazendo, por isso, qualquer sentido procurar medir as partes respectivas de um e de outro), memorialistas discretos como o Amândio Sousa Vieira não são bem assim nem para lá caminham.
Os textos da sua autoria que se repartem por seis capítulos: Capítulo I – Baile da Espadelada; Capítulo II – Vida no Campo; Capítulo III – Feiras; Capítulo IV – Festas e Romarias; Capítulo V – Outras Tradições; Capítulo VI – Ranchos e Rusgas; falam por si. E quando as palavras são ditas e escritas assertivamente, apenas teremos que as tomar como emprestadadas, por preito e gratidão: O interesse de Amândio Sousa Vieira pelas tradições e costumes de Ponte de Lima reflecte no fundo a paixão de uma vida (…). O seu vasto arquivo é a melhor prova disso. Um amante anda sempre à procura da coisa amada… – citamos da “Introdução” de José Velho Dantas.
Amândio Sousa Vieira acaba de prestar um valiosíssimo serviço à reconstituição das tradições e da etnografia da região que ele mesmo tanto ama, levando-nos a relacioná-las (Ex auctoritate propria) com as diversas expressões da vida social, artística e identitária.       
        NOTA MÁXIMA!

(In, Cardeal Saraiva, Ano 108, N.º 4647, 30 de Março de 2014, p. 16 - "Ao correr da pena e da mente" - 175) 

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