Saturday, April 13, 2013

“Fé e religiosidade popular” dão mote a uma obra publicada em Ponte de Lima!


“Todos sabemos que património só o é quando as populações se nele revêem, quando o mesmo faz parte das suas representações, pela memória, tradição e identidade, criando correspondências, muitas vezes, de prestígio num sentido que revela poder e sentimento de pertença”.

Victor Mendes

Apesar de termos “entre mãos” uma série de livros para apreciar, e dentro das nossas limitações – porque nos escusamos em tocar todos os instrumentos ou de cairmos na promiscuidade do “sapateiro que quer ir além da chinela” – fazermos o nosso comentário possível, cauteloso e devidamente ponderado, não resistimos à tentação de escrevermos algo acerca de uma obra editada pelo Município de Ponte de Lima, e que, recentemente, nos foi gentilmente oferecida – com a anuência da presidência – pelo vereador do Pelouro da Cultura, nosso particular amigo Franclim Castro e Sousa. Na nossa modesta opinião – ainda que revestida de alguma subjectividade, porque outros tê-la-ão de maneira diferente –, trata-se de uma obra esteticamente interessante, reproduzindo uma abordagem temática sobre «Fé e religiosidade popular em Ponte de Lima», com oportuna incidência no valioso acervo patrimonial limiano, nomeadamente “cruzeiros, vias-sacras, nichos e alminhas”. São autores da referida obra: Carlos A. Brochado de Almeida (Coordenador), Mário Carlos Sousa Gonçalves e Ana Paula Azevedo Ramos B. de Almeida. A Coordenação Editorial esteve a cargo de Ovídeo de Sousa Vieira.


É evidente que, para além da nossa positiva impressão estética da mesma obra, muito pouco mais teremos a dizer acerca da mesma, já que não se trata uma obra poética ou literária, motivadora de interpretações a figuras de estilo ou inédita criatividade narrativa. Cientificamente falando, ficamo-nos pela sensação de estarmos perante aquilo que o presidente do município, Victor Mendes, classifica de “um extenso rol de património”, onde tudo se apresenta e conjuga de uma forma clara, cabendo-nos apenas comungar das suas palavras – decalcadas na certeza do sentimento de pertença, que “se espelha a verdadeira ligação à Terra, o apego das Gentes, o pulsar das vivências quotidianas…” –, quando afirma que “este trabalho é disso um excelente testemunho, expondo um extenso rol de património que engloba os cruzeiros, as vias-sacras, os nichos e as alminhas que pululam em todas as freguesias do concelho”.
Gostamos de uma forma particular da introdução do Professor Doutor Carlos Alberto Brochado de Almeida, director do Museu dos Terceiros [Mute], Doutor em Pré-História e Arqueologia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, um dos mais activos investigadores de Arqueologia, por todo o Norte do País, particularmente nas bacias dos rios Minho, Lima e Cávado, consultor científico das câmaras municipais de Ponte de Lima, Barcelos e Vila Nova de Cerveira, de quem conhecemos e possuímos dezenas de trabalhos ligados à arqueologia, e com quem tivemos o prazer de conversar aquando das escavações em S. Paio de Antas (Agra), Esposende, onde visualizamos o desconforto perante a incapacidade reivindicativa da arqueologia – dir-nos-iam que tudo o que havia para fazer estava feito e as obras do “IC1” (hoje A28) iriam prosseguir em nome do futuro –, onde nos faz uma retrospectiva histórica/arqueológica da simbologia da morte, espelhada na cruz, desde os tempos imemoriais, iniciada no Médio Oriente, passando por Roma, Alta Idade Média até aos nossos dias. Apesar de nesta introdução, o Professor Brochado de Almeida fazer jus ao seu estatuto de “empático comunicador”, como é conhecido entre os seus discípulos e admiradores, poderia ir um pouco mais além, na vertente antropológica e iconográfica, das crenças ou da adaptação física – dos ora estudados (ou catalogados) cruzeiros, vias-sacras, nichos e alminhas – dos ancestrais cultos do “Homo religiosus”, também estudado por Mendes Corrêa, em “Os povos primitivos da Lusitania”, publicado em 1924: “Nos cultos, superstições, amuletos, ornatos e outros costumes (…)”. Mesmo assim, deliciamo-nos com algumas das descrições, para nós, circunstancialmente interessantes em termos de “pontilhados cenários”, tomados na essência do seu significado de conjunto das vistas e dos acessórios que ocupam o local (e não palco) de uma representação, neste caso religiosa: “Não há paróquia do Minho e muito menos da Ribeira Lima que não tenha as suas alminhas. Muitas ou poucas, elas começaram a povoar as bermas e as encruzilhadas dos caminhos que desde o século XVI cortavam e serviam o território, fosse ele o agro-florestal ou o inter-regional. Hoje é fácil encontrá-las, perdidas por velhos caminhos já sem servidão ou deslocadas para junto dos novos traçados que a política viária do fontismo liberal idealizou e foi concretizando a partir da segunda metade do século XIX”. E ficamo-nos por aqui, dado que se impõe a todo o limiano que se preze, a aquisição desta obra e subsequente apreciação, sempre com a consciência de que em História não há versões finais, nem certezas inabaláveis.       
          Para terminarmos, apenas um reparo sem grande relevância: algumas das fotografias, mereciam melhor tratamento. De resto, os nossos parabéns aos autores, ao coordenador e ao Município!

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