Friday, December 12, 2014

Álvaro Santos Pereira e os “jobs for the boys” de Paulo Portas!...

«Tenho orgulho de ter lutado pelo meu país. Tenho orgulho de ter mostrado que é possível ir contra lóbis e interesses instalados.»

Álvaro Santos Pereira

Por certo que muitos dos habituais leitores destas nossas deambulações literárias estarão recordados quando, em Agosto de 2012, escrevemos que sempre fomos leitores inveterados de teses científicas, em qualquer vertente da teoria do conhecimento, acreditando – ainda que com algumas reservas – naquilo que os seus autores podem trazer de novo ao pensamento universal. E quando essas teses se apresentam como soluções aos acidentes de percurso das áreas a que se confinam, faz aumentar em nós a “curiosidade especulativa”. Na altura, referíamo-nos ao livro «Portugal na hora da verdade: como vencer a crise nacional» da autoria de Álvaro Santos Pereira, aquele que após tomar posse como ministro da Economia, e contrariando os apelativos dos defensores dos prefixos (pão quentinho a sair do forno de Miguel Relvas), aconselhou a que o chamassem de Álvaro, sem o doutor (aplaudimos de pé), livro esse onde procurava mostrar que Portugal vive hoje três grandes crises: a crise das finanças públicas, a crise da competitividade e do crescimento e a crise do endividamento externo. Entre as questões debatidas, incluem-se as seguintes: qual é o verdadeiro estado das nossas finanças públicas? Porque é que o nosso Estado gasta tanto? Quantos institutos e outras entidades públicas existem e quanto gastam? E porque estamos tão endividados? Será a dívida nacional sustentável? Quão grave é o problema de competitividade das nossas exportações? – questões e interrogações pertinentes, reforçadas pelo facto de ele mesmo sublinhar ao longo da mesma “dissertação” que havia fortes indícios de que o nosso Estado estava a matar a economia nacional, afirmando mesmo que os funcionários públicos não eram responsáveis por esta situação: “Uma verdadeira reforma do Estado que torne as nossas contas públicas saudáveis e sustentáveis não deve ser feita contra os funcionários públicos ou contra o serviço público. Muito pelo contrário. Uma verdadeira reforma da administração pública terá de melhorar o serviço público, não piorá-lo. Uma verdadeira reforma da função pública terá de aumentar o prestígio do emprego público, não diminuí-lo. Uma verdadeira reforma do Estado terá de incentivar a auto-estima dos funcionários públicos e fazer com que sejam eles próprios a estimular a mudança de que a nossa administração pública necessita”.


Como era previsível, este tipo de teorização levá-lo-ia à precipitada saída do governo ultraliberal de Passos Coelho. Hoje, voltamos a ser confrontados com uma nova “bomba-relógio”, intitulada «Reformar sem medo: um independente no Governo de Portugal», com 1.ª edição em finais de Novembro deste mesmo ano. Seu autor, Álvaro Santos Pereira, vem agora a “terreiro” afirmar que «durante muitos anos, eu estive na posição confortável de poder criticar à distância. Em livros, em blogues, em artigos de jornal. Além disso, como vivia no estrangeiro, a minha posição era ainda mais cómoda, visto que as minhas críticas certamente não afectavam o meu dia-a-dia. Podia criticar o que quisesse, pois isso não teria consequências para a minha vida privada ou familiar…» (p. 16), numa espécie de preâmbulo ao capítulo de “Uma missão (quase) impossível”. É nesta nova “dissertação” de «Reformar sem Medo», que o ex-ministro da Economia põe o dedo na ferida, abordando de uma forma clara um pouco de tudo: intriga política (sendo Paulo Portas uma das figuras principais), luta contra lóbis e as negociatas de bastidores com a troika: «Quando saí do Conselho de Ministros, pensei que tínhamos dado um importante passo para conseguirmos o IRC a 10% para os novos investimentos. Porém, sabia também que ainda havia muito caminho para andar, até porque Vítor Gaspar claramente não era apologista da medida. Não me enganei. No sábado seguinte, marcámos uma reunião com o Ministro das Finanças, em que estiveram presentes também Carlos Moedas e a minha equipa. O resultado foi desastroso. Vítor Gaspar disse muito claramente que quem tinha a tutela e a responsabilidade das Finanças em Portugal era ele, e que ele não gostava da medida…» (p. 343). Vítor Gaspar e Carlos Moedas, dois nomes sonantes, privilegiados em calendas europeizadas.
«Reformar sem Medo», acusa decepções, ineficiências e, sobretudo, crítica a troika, os lóbis, o “país que venera formalismos” e Paulo Portas: «Se há algo que me orgulho de ter feito durante a minha governação foi a luta contra os lóbis e os interesses instalados. Sei que sou suspeito, mas penso que na nossa democracia não há muitos exemplos de Ministérios da Economia tão independentes como o nosso foi (…) Os lóbis nunca tiveram a minha simpatia. Os aparelhistas partidários também não. No meu Ministério os lóbis ficaram à porta. E os aparelhistas nunca encontraram na nossa equipa quem lhes desse ouvidos» (p. 223) – exame de contrição em louvor próprio, para depois desferir algumas alfinetadas a Paulo Portas: «Neste sentido, um colega do Governo disse-me uma vez que havia a percepção de que as coisas não andavam bem no Ministério da Economia e do Emprego. Perguntei que coisas eram essas. As reformas? Não disse ele, as reformas estavam a ser feitas e até tínhamos feito um bom trabalho. Os cortes das rendas e o combate aos interesses instalados? Não, isso nós também tínhamos feito. A reforma do Estado no que dizia respeito ao Ministério e a reestruturação das empresas públicas? Não, isso também foi alcançado e bem, respondeu-me. Então, o que é que falta?, perguntei. “Sabes”, respondeu ele, “o partido queixa-se que as nomeações nunca mais arrancam, que vocês demoram muito a substituir os socialistas que lá estão.” Foi aí que eu percebi (ou, melhor, confirmei) que a alegada ineficiência do meu Ministério estava na “demora” em nomear os correligionários dos partidos para os cargos existentes nas diferentes empresas públicas e instituto…» (p. 50). O homem do “irrevogável”, aquele que há muitos anos, aquando director do “Independente”, abominava política e políticos, mantinha a mesma serenidade e a mesma “lata” dos “aparelhistas” partidários, na procura de darem emprego a tanta gente cujo único mérito era (e é) o cartão de militante. Daí, não estranharmos o bater da porta do – até aqui líder da concelhia centrista em Viana do Castelo – nosso particular amigo Carlos Meira.
Agora começamos a entender o porquê do nosso livro «Baliza trágica de um naufrágio» ter vários engulhos no seio do corporativismo instalado, o que tem dificultado a sua aceitação nos “aparelhos” editoriais. Há muita coisa por explicar e os “aparelhistas” movimentam-se no sentido de silenciarem quem não alinha no mercantilismo das “consciências aparelhadas”, contrário ao pensamento de Pascal, quando afirma que «a consciência é o melhor livro de moral e o que menos se consulta».
         Até quando democracias assim condimentadas? A pergunta fica no ar!

No comments: