«A ideia teve o seu começo involuntário. O
Poeta tem razão: “Todo o começo é involuntário”. Depois, desceu sobre a ideia
alguma luz e descobriu-se-lhe alguma forma…»
Fernando Hilário
Quando anuímos ao
convite do Professor Doutor Fernando Hilário, para estarmos no dia 9 de Abril
do corrente ano, na Sala Couto Viana da Biblioteca Municipal de Viana do
Castelo, com o sentido de darmos o nosso modesto contributo emocional, perante
esta maravilhosa matéria-prima que resultou neste não menos maravilhoso produto
acabado «DESENHOS PARA PESSOA», teremos de confessar que tememos um pouco pela
nossa “integridade intelectual”, já que aliada à circunstância de padronizarmos
a arte pelo gosto (emergente da natureza dos seres humanos), sempre pensamos,
por defeito de formação – os filósofos
não são os únicos a desenvolver teorias de arte –, que o valor da arte está
necessariamente ligado ao prazer estético ou à satisfação; estamos, também,
perante uma das grandes referências da Literatura e da Arte, em Portugal. Sim,
de uma forma sintetizada, Fernando Hilário licenciou-se em Letras e doutorou-se
em Teoria da Literatura e Literatura Comparada; foi professor do ensino
secundário e do ensino superior privado e público; trabalhou na Escola Superior
de Educação do Instituto Politécnico do Porto e com a Faculdade de Letras da
Universidade do Porto na área da formação pedagógica de professores; é membro
investigador do Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; co-fundador do Centro de línguas
e literaturas da Universidade Fernando Pessoa, Ponte de Lima; tem obra
publicada nas áreas do Modernismo português, das Artes plásticas e da
Literatura angolana; actualmente, desenvolve trabalho de investigação na área
da Poesia de expressão significante.
E poderíamos ficar por
aqui. Mas não! Onde ficava a ideia do belo e do juízo estético, situado por
Kant entre o logicamente necessário (teoremas matemáticos) e o puramente
subjectivo (expressões de gosto pessoal)?...
Assim sendo, e tendo em
conta que a subjectividade resulta da aparência de um juízo cognitivo, porque
exprime um sentimento de aprovação pessoal, depressa nos atrevemos a saltar
essa temerosa barreira do jogar à defesa, intelectualmente falando, por noção
clara de que a beleza precisa de ser apreciada subjectivamente. Hans-Georg
Gadamer (1900-2002), filósofo alemão considerado como um dos expoentes máximos
da hermenêutica filosófica (interpretação de textos escritos, formas verbais e
não verbais), uma das nossas redes neste “trapézio” da Arte, apesar de ter
defendido que a abordagem à arte através da “experiência do gosto estético é
relativamente externa e… algo redutora”, escreveu, também, a dado momento, que
«Uma obra de arte… exige ser construída
pelo espectador ao qual é apresentada. Não é… algo que possamos simplesmente
usar para um fim particular, nem uma coisa material da qual possamos fabricar
alguma outra coisa. Pelo contrário, é qualquer coisa que apenas se manifesta e
se exige quando é reconstruída pelo espectador» – citamos. Ainda, segundo
Gadamer, é por isso que o juízo estético e a produção artística andam de mão
dada, sendo que a criatividade do artista precisa de público e, para o público
(condição nossa, naquele momento e agora), a arte criativa oferece «a experiência que melhor cumpre o ideal de
um deleite “livre” e desinteressado» – voltamos a citar Gadamer. Luís
Filipe Castro Mendes, diplomata e poeta (ora nomeado Ministro da Cultura), que
conhecemos nas Correntes d’Escritas deste ano, por exemplo, referiu-se a
Fernando Pessoa como um dos grandes desafiadores da modernidade. Segundo Castro
Mendes, o poeta é aquele que mais inspira do que é inspirado e o seu ganho está
nos leitores, sinal acrescido dessa sensação de ganho, quando tem alguém que o
leia. Aí, a perda é como uma irreversibilidade melancólica.
Com «DESENHOS PARA
PESSOA» de Fernando Hilário, estamos perante a expressão da emoção e a ideia de
a Arte ser uma fonte de entendimento, quando o artesão sabe o que quer fazer
antes de o fazer, passando aos outros – nomeadamente aos espectadores –, no
dizer de Tolstoi, «intencionalmente e por
meio de certos sinais externos, sentimentos que ele viveu e de os outros serem
infectados por estes sentimentos e também os experimentarem»; e perante um
livro com várias vertentes artísticas, que conjugadas no plural deixa de ser
“simplesmente arte”, para ser, no dizer e na acção de Fernando Hilário, um «Baú da Arte-Toda», um legado ao Mundo de
Fernando António Nogueira Pessoa, no plano literário, poético, estético e
filosófico. No fundo, a actividade artística, inspiradamente experienciada por
uma profunda emoção, usando a aptidão com palavras e desenhos, numa rigorosa
expressão estética e emoção geradora, cujo sucesso desse esforço, acaba por
resultar no estímulo da mesma emoção geradora e do rigor estético no seu
público, circunstancialmente, os espectadores-receptores.
Sentimos em «DESENHOS PARA PESSOA», o propositado propósito de omissão dos
títulos, forma de libertação, até cronológica, com o fim do exercício de livre
expressão estética. Só assim, no dizer de Tolstoi, é que os artistas comunicam
a sua experiência emocional, não no sentido de profetizarem, mas de levar-nos
ao modo distinto de entendimento da experiência humana!
«DESENHOS PARA PESSOA»
é de facto um livro maravilhoso, e porque não dizer magnífico, porque agrega a
forma significante e a expressão de emoção. Há uma perfeita relação entre os
desenhos do Hilário para Pessoa, e os textos de Pessoa em Pessoa, conjugando-se
harmoniosamente, também, as cores e a articulação do espaço.
Ambos, os “Fernandos” –
em Pessoa e em Hilário –, conseguiram captar a atenção do público, manifesta
convicção nossa de que uma boa ou grande Obra de Arte – nesta circunstância
apelativa de «DESENHOS PARA PESSOA» em Fernando Hilário –, estimula e dirige as
percepções da audiência e não é apenas objecto passivo de apreciação. Daí dizermos
que gostamos, e isso nos basta.
NOTA MÁXIMA!
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