Recorrendo ao silêncio!…
«Há duas
coisas que é absolutamente necessário compreender: a natureza do espaço e a
natureza do silêncio. Interessa sumamente descobrir o que significa
"espaço". Não queremos referir-nos à distância entre a Terra e a Lua,
porém ao espaço psicológico, o espaço interior. A
mente em que não há espaço é uma mente estreita, insignificante, vulgar; está
presa numa armadilha, e os movimentos que faz dentro dessa armadilha chama
"viver". Mas, para se descobrir o que é esse espaço interior, é
necessário observar o espaço exterior»
Krishnamurti
Há momentos em
que necessitamos de recorrer ao silêncio, refugiando-nos na leitura e releitura
das grandes referências que nos têm acompanhado ao longo da vida e são companhia
permanente das nossas estantes, onde as obras nunca são adquiridas às suas
medidas. É no silêncio, quase clandestino, que por vezes preenchemos tardes a
“discutir” antagonismos, interactividades, destruição de mistificações,
ausência de mensagens inequívocas, principais instrumentos de informação,
falsos passadismos, consequências de mudança, servir ou obedecer ao jogo,
sempre com a noção de que antes de qualquer acção existe a lealdade à nossa
convicção.
É no silêncio,
porque a esse exercício somos muitas vezes obrigados, que amamos a terra que
nos pariu. Contudo, sentimos um enorme vazio e tentamos descortinar as
concepções da razão, constituinte e constituída. Isto quando procuramos a
capacidade de ascender ao mundo das ideias, quer como essências, quer como
valores. Passamos a abominar o cliché de «O homem é um animal racional», porque
admitido como a diferença específica.
Daí
gravitarmos mais na “formulação madura” da “razão suficiente” leibniziana,
tendo em conta que a mesma enuncia que nada é sem
que haja uma razão para que seja ou sem que haja uma razão que explique que
seja. Sentimos um vazio, mas, mesmo assim, amamos a nossa Terra Natal. Pena é
que, circunstancialmente, a “orgânica” esteja à mercê dos “usurpadores”,
crentes na “sabedoria superior”, dilacerante da natureza da substância, neste
caso concreto, o modo do conhecimento da substância e essência da razão.
Foi para quebrar um pouco do silêncio (quiçá, a “monotonia
do silêncio”) que resolvemos anuir ao convite do Raul Pereira, para assistirmos
ao lançamento do seu livro «Dentro de um Cesto de Rosas (Vila Franca:
Celebração e Notas)», uma sentida experiência científica, por se dar conta de
iniciativas similares da Direcção Geral do Património Cultural, de salvaguarda
do património imaterial português, pensando de imediato na terra onde cresceu e
no seu mais alto valor cultural: a Festa das Rosas.
Há dias em que, impreterivelmente, necessitamos do
silêncio, e dele nos afastarmos, como espaço dentro de nós, criado pelo
observador, pelo censor: o espaço em que ele vive. Mas, de vez em quando, faz
falta um banho de multidões. E o Raul Pereira teve-o, merecidamente: «Quanto a mim, Raul Alexandre da Rocha
Pereira, fiz o que achei que me competia: retribuí, com aquilo que pude e sei,
o que agora me parece um mero alfinete no cesto de rosas que constitui tudo o
quanto de Vila Franca recebi enquanto cresci.»
Silêncio, humildade e acção… VERBUM PRO VERBO!
[Imperativos da Memória (II) - Recorrendo ao silêncio!... A Aurora do Lima (Viana do Castelo), Ano 163, Número 11, 29 de Março de 2018.]
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