«Estava a começar o século XVIII quando um
jovem médico português embarcou num navio inglês com destino a Londres. Os
portos portugueses viam passar nessa altura muitos navios ingleses, devido à
assinatura do Tratado de Methuen. O médico chamava-se Isaac de Sequeira Samuda
e fugia do seu país, perseguido pela Inquisição…»
Manuel Curado
Já em nada nos surpreende
esta intensa actividade intelectual do Professor Doutor Manuel Curado, figura
ímpar dos meios académicos, da Filosofia e das Ciências Cognitivas. Investigador
meticuloso, exigente, experiencia todo o seu exercício mental, permanente,
quase sem descanso, tal como um dia escreveria Daniel Serrão, Professor
Catedrático de Medicina, “com uma clareza por vezes quase desconcertante e com
uma poderosa racionalidade lógica, Manuel Curado elabora um texto rigoroso e um
intertexto subtil, dialogando, de igual para igual, com alguns monstros sagrados da Filosofia, da
Antropologia e das Neurociências”. Felizmente, foi sempre essa a percepção que
tivemos deste insigne MESTRE, tomando tal “comenda” por nos acharmos – talvez
ambos – ao tempo aristotélico, sensível à criação da prosa científica, altura
em que gravitavam uma grande amplitude de temas: lógica, filosofia, psicologia,
ética, metafísica, sociologia, política, teoria literária, biologia e física.
Daí, enquanto peripatético que somos o denominarmos de MESTRE, resguardados
pela filosofia que, circunstancialmente, tem por objecto o Ser. Conhecer melhor
o Professor Manuel Curado, tal como já o fizemos e continuamos a fazer (em
revisitações permanentes), obrigar-nos-á à leitura da sua magnífica obra «Luz
Misteriosa: a consciência no mundo físico» que, no dizer do Professor
Catedrático de Inteligência Artificial, Luís Moniz Pereira, “é uma preciosa
ajuda à missão exploratória da fronteira do conhecimento da luz interior, que é
afinal tão indispensável às restantes”.
O Professor Manuel
Curado, por se dedicar à Ética Biomédica, Filosofia da Mente, e à História das
Ideias, da Psiquiatria e história da herança judaica portuguesa na Medicina e
na Filosofia, não estranhamos que tomasse entre mãos a extraordinária obra
épica de Isaac Samuda, As Viríadas.
Segundo Maria Helena Rocha Pereira, trata-se de “uma epopeia portuguesa
setecentista inédita, mas não ignorada, em décimas bem ritmadas, cujo autor,
Isaac Samuda, é um dos judeus de talento que o fantasma da Inquisição chegou a
aprisionar por um tempo e ameaçava persegui-lo de novo, pelo que teve que
emigrar…”. Ainda segundo a mesma ilustre docente da Universidade de Coimbra,
“estes e muitos outros dados, incluindo a multiplicidade dos interesses
científicos de Samuda, são cuidadosamente analisados pelo autor desta edição,
Manuel Curado, professor de Filosofia na Universidade do Minho – Braga. Assim,
não deixa de pôr em relevo a presença dos ecos das epopeias clássicas, com a
intervenção dos deuses, a paixão de Viriato por Ormia, que Tântalo, um dos
guerreiros lusitanos, também pretende.” – citamos do prefácio.
Assumindo a responsabilidade da edição crítica
(p. 17-193), notas complementares (p. 497-642), Índice de assuntos
seleccionados (p. 645-661) e onomástico (p. 663-677), o Professor Manuel Curado
empresta a esta magnífica obra, numa edição esteticamente perfeita da Imprensa
da Universidade de Coimbra, a síntese de uma laboriosa investigação sobre a
história acidentada dos autores e do livro, “que nos revela, na origem da
escrita, outro também choque cultural justificando a diáspora portuguesa,
incluindo Isaac de Sequeira Samuda: a intolerância religiosa.” – citamos Anabela
Rita, da Universidade de Lisboa, em nota de apresentação. Teremos de concordar
com a autora da nota de apresentação, dado que devemos ao Professor Curado este
precioso trabalho de edição que, “séculos depois, nos oferece uma epopeia
perdida, limpando-lhe o pó, aclarando-lhe o verbo, perscrutando-lhe a história
da escrita e dos autores, perseguindo-lhe o rasto… até a podermos colocar na
estante, privilegiados por podermos contar, na nossa Literatura, com mais uma
épica reflexão sobre a identidade colectiva…”. E muito mais se poderia dizer,
se não fossemos condicionados pela elevadíssima veneração e/ou desmesurada
amizade por este insigne filósofo, o que acabaria por criar nos leitores alguma
sensação de subjectividade, parcialidade e falta de rigor de análise, o que não
é o caso. Daí, tomarmos como emprestadas as palavras dos outros.
Falando agora da obra e
do seu autor, teremos em dizer que Isaac Samuda morreu relativamente novo e sem
descendência directa. Tal como escreve o Professor Curado, o amor de Isaac
Samuda a Portugal nunca desapareceu: “Entre os seus papéis manuscritos estava
um poema épico extraordinário em que, irmanando os antigos Lusitanos aos
Portugueses, contava a história heróica da luta de um povo pela liberdade e
contra a tirania. Muitas das descrições de paisagens que surgem no poema são
claramente de terras portuguesas, com Évora e a planície alentejana. Esse poema
épico tem o nome de Viríadas e não
chegou a ser concluído por Samuda. O seu amigo que acompanhou muitos dos seus
passos durante a vida, Castro Sarmento, resolveu terminar essa epopeia.” –
esclarece o Professor Manuel Curado.
O poema é composto por
13 cantos com 1466 estâncias numeradas: Canto
I: Samuda apresenta Viriato aos seus leitores através das suas acções; Canto II: As Viríadas começam com um momento de pausa a meio de uma guerra
longa; Canto III: é composto na
íntegra pela segunda parte do discurso de Viriato aos seus comandantes
militares; Canto IV: Depois do
discurso longo que dirigiu aos seus comandantes militares, Viriato passeia pelo
campo e acaba por entrar num templo romano; Canto
V: Em Macária (Chipre), Vénus vê passar Minerva a caminho da casa do Sono; Canto VI: Morfeu e os seus irmãos chegam
à cidade de Afrodísea; Canto VII:
Este Canto é especialmente eloquente sobre o aspecto paradoxal do conflito
entre os povos; Canto VIII: Depois
dos ritos religiosos, segue-se o banquete da vitória; Canto IX: Neste Canto continua o período do descanso dos guerreiros
depois de uma batalha em que foram vitoriosos; Canto X: Continua a história dos amores de Tântalo e de Ormia
depois da ameaça de Ate, a deusa da Discórdia; Canto XI: Regressando da floresta, Tântalo passa por uma fonte; Canto XII: Viriato avança para Sul a
caminho da Andaluzia; Canto XIII:
Continuando a sua campanha na Andaluzia, Viriato ataca os Sidónios que tinham
entrepostos comerciais no Sul da península.
E mais não diremos, sem
que antes transcrevamos a estância 17 do Canto V, Canto que se nos apresenta
como a essência do tipo do Poema, tão presente, até no tempo presente: «Alerta! Alerta! Filhos, não durmamos! /
Alerta! Alerta! Amigos, despertemos! / A defensa c’o tempo não percamos! /
Quando um forte inimigo às portas temos, / O que devemos de fazer, façamos! /
Em cuidar muito não nos descuidemos, / Que há grandes riscos na menor demora, /
Perde-se um reino por perder-se uma hora.»
NOTA MÁXIMA!
1 comment:
Acabo agora de assistir a uma palestra de Manuel Curado,Estranhamente no Congresso do Espírito Santo. O tema que apresentou foi este, o do artigo, e notava-se a profunda crença nestes escritos judaicos contra a Trindade Divina, e de tal forma se achou LÓGICO, e satisfeito, que não deu conta das faltas contra a verdade, trocando RAZÃO por RACIONALISMO, e outras coisas mais. Mas, enfim, Manuel Curado, apenas fez cópia dos erros contidos na obra do autor judaico... confunde a questão das Pessoas Divinas ao considerar Deus, toma as ditas "imperfeições" das pessoas como imperfeições concretas no sentido mais moderno... enfim... Lamentável, porque certamente algumas pessoas menos bem formadas poderão ter ficado confusas. Manuel Curado, deveria ter consultado as entidades teológicas que lhe pudessem ensinar sobre cada uma das matérias mencionadas... provavelmente consultou autores modernos, e tem uma preparação muito moderna para poder mergulhar em assuntos desta profundidade doutrinal!
Quanto ao documento judaico, é uma curiosidade escrita por um homem inteligente ao qual falta uma formação nas matérias onde se atreveu... nada de mais!
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