“Muitos
consideram o intelecto como um armazém para encher, quando é um instrumento
para usar; na prática é uma e outra coisa”
A.Schweitzer
Manuel Franco Pita,
médico há longos anos no norte do País, acaba de lançar o seu primeiro livro,
sob a chancela da “Calendário de Letras”, com o sugestivo título «Como és
linda, Ana...». Este magnífico romance, o qual tivemos o grato privilégio de o
apresentar publicamente, resulta de um sonho antigo, pois, ao longo da sua
vivência profissional, ao ter conhecimento de muitas histórias – de vida umas,
de morte outras, muitas de sofrimento e outras de amor – “viu o homem no seu
expoente máximo, estóico enfrentando a adversidade, outras derrotado e sem
esperança. Mas viu muitas coisas que fazem dele o expoente máximo da criação, o
homem é um ser com uma imensa capacidade de amar. Quem quer que seja, dêem-lhe
alguém e ele amará…” – lemos em sinopse. E assim nasceu uma história feita de
muitas histórias.
Mesa - da esquerda para a direita: Francisco Madruga (Calendário de Letras); Manuel Franco Pita (Autor); Porfírio Silva (Apresentador); Américo Carneiro (Academia de Letras e Artes - ALA). |
De facto, «Como és
linda, Ana…» é uma história feita de muitas histórias, onde as bem
caracterizadas personagens se interligam, sem perecerem ou entrarem em conflito
entre a ciência e a espiritualidade, mesmo quando nos é dado saber que a
ciência invade cada vez mais os diversos âmbitos da experiência e do pensamento
humanos. Assim, Manuel Franco Pita, enquanto médico, através deste mesmo
romance, faz-nos sentir que a espiritualidade e a Ciência procuram satisfazer o
desejo humano de conhecimento do mundo e são dois modos de atribuir sentido à
existência e à ordem da realidade.
A realidade em «Como és
linda, Ana…», revela-se-nos na afinidade entre anjos e demónios, uma espécie de
interesse radical dos seres humanos pela sua própria sobrevivência. As
personagens, espelham bem o sentido psicológico ou utilitário, da mesma
sobrevivência. Em «Como és linda, Ana…» ficamos a saber que “há um tempo de médico
e outro de Deus”, ou que “em coma profundo ter-se-ia verificado a abolição
completa da percepção da dor mas tal significaria também que o indivíduo
estaria mais perto da morte, o que quer que ela fosse. Talvez a travessia de um
túnel, num estado de bonomia e paz, com uma luz ao fundo, assinalando uma nova
ordem das coisas e um novo modo de sentir, um novo modo de ser e estar”; que na
dermatologia também há cardeais, “porque a medicina também é um papado com os
seus padres, bispos e cardeais”; que há gente que não quer “enveredar por uma
senda de ressentimento, animosidade, ódio ou algo desse teor…”; que há quem ame
um, voando “como as águias, as asas serenas abertas batendo devagar, o vale a
passar lá em baixo…” e outro, voando “como voam os falcões, em golpes de asa
febris, a cruzar os vales e os rios, a subir ao cimo e a descer rasante com a
urgência de haver muito para dominar”; que há carícias que duram “o tempo de um
relâmpago”; que a “máfia não tem sentimentos, se os tivesse não existia”; que
através da eclosão de ódios antigos, ancestrais, pode-se chegar à limpeza
étnica, qual “caixa de Pandora que Gorbatchev abriu”, segundo um antigo agente
do KGB; que “a vida pára quando pára o coração, não quando param os outros
órgãos. É a paragem cardíaca o último evento vital…”; que, como o filósofo o
aventara, “ o livre arbítrio era o motor da vida e do mundo e que apenas os inteligentes
triunfavam”; que os homens mentem mais, mas as mulheres mentem melhor; e que
“há coisas que estão vedadas aos homens. Ou para além das suas capacidades.
Sonhar a cores… Sonhar com Deus…(…) Talvez sonhar com Deus seja permitido às
mães…”.
Em suma, e de modo a
concluirmos, diremos que, tomando como nossas as palavras em sinopse, «Como és
linda, Ana…» é uma história feita de muitas histórias e acção firmada «de médicos que se apaixonam, da loucura de
um deles por crianças, de uma advogada que vê a obra de meia vida desfazer-se e
que recomeça, de mafioso que dá a vida por um polícia, de um cirurgião exímio
em final de carreira que aceita o desafio da vida – separar duas gémeas
siamesas numa separação perigosa. E de outras histórias ainda. Porque cada
instante da vida tem uma história. De tudo se poderá concluir que o amor é
sublime, que os médicos talvez não saibam tanto como parece e que às mães seja
permitido sonhar com Deus. Porventura muitas coisas mais, mas que cada um
conclua o que achar melhor».
É essa a saudável
dinâmica deste magnífico romance, que termina com sorrisos partilhados de Paulo
Fontoura e Rosemary Abreu [Beijaram-se.
Primeiro como a brisa beija as flores depois como o vento beija os pinhais. /
De mão dada no corredor foram como a água de um rio. De um rio calmo, azul,
perfeito], quando de uma enfermaria lhes chegou “a música da voz de uma
enfermeira a acariciar o cabelo de uma criança doente. E levaram consigo a
poesia que fluiu, quando ela disse – Como és linda, Ana…”, uma linda menina que
morreu de cancro, para a qual, o médico Manuel Franco Pita, quis escrever-lhe o
livro mais belo do mundo: Para ti Naná,
para leres no Céu… E para nós, aqui na Terra, por forma a sairmos do estado
de coma profundo, ainda que por imperativo da travessia de um túnel, “com uma
luz ao fundo, assinalando uma nova ordem das coisas e um novo modo de sentir,
um novo modo de SER e ESTAR”.
Nota máxima… Leitura que se recomenda!
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