Tuesday, January 28, 2014

Michael Walzer e “as esferas da justiça”

Na prática, a destruição do monopólio do dinheiro neutraliza o seu predomínio”.

Michael Walzer

Da leitura que fizemos de Michael Walzer, numa sociedade em que os significados sociais se encontram definidos e hierarquizados, a justiça vem em auxílio da desigualdade. A teoria da justiça está atenta às diferenças e é sensível aos limites. Nas sociedades mais diferenciadas a justiça tem um campo mais vasto de acção, pois, há mais bens diferenciados, mais princípios distributivos, mais agentes e mais meios de actuação. E quanto maior for o campo de acção da justiça, mais evidente se tornará que a forma assumida por esta será a da igualdade complexa. O despotismo tem também maior campo de acção.
A justiça, é encarada como o contrário do despotismo, tem pois a ver com as mais terríveis experiências do séc. XX. A igualdade complexa é o oposto do totalitarismo: máxima diferenciação, em vez da máxima coordenação. Como sabemos, as formas contemporâneas de política igualitária tiveram a sua origem nas lutas contra o capitalismo e o especial despotismo do dinheiro. O despotismo do dinheiro assusta menos do que as formas de despotismo que tem a sua origem no outro lado da linha que separa o dinheiro da política. Sem dúvida, a plutocracia assusta menos do que o totalitarismo; aí a resistência é menos perigosa. A principal razão desta diferença é que o dinheiro pode comprar cargos, educação, honras, mordomias, etc., sem coordenar radicalmente as várias esferas distributivas e sem eliminar processos e agentes alternativos. Muito depende dos cidadãos, da sua capacidade de se afirmarem através do conjunto de bens e de preservarem a sua própria noção do seu significado dos mesmos.
A igualdade complexa continuará a ser uma possibilidade viva, mesmo que novos adversários da igualdade venham substituir os antigos. Esta possibilidade é permanente para todos os efeitos práticos, tal como a oposição que lhe é feita. O estabelecimento de uma sociedade igualitária não representará o fim da luta pela igualdade. Tudo o que se pode esperar é que a luta se torne um pouco mais branda à medida que os homens e mulheres aprendam a viver com a autonomia das distribuições e a reconhecer que resultados diferentes para pessoas diferentes em diferentes esferas tornam a sociedade justa. Por outro lado, a política hoje é apenas uma, embora provavelmente a mais importante, das muitas esferas da actividade social. Não se pode garantir aos cidadãos uma “oportunidade” em toda a parte. Não se lhes pode garantir uma “oportunidade” onde quer que seja. Porém, a autonomia das esferas produzirá uma maior repartição dos bens sociais do que qualquer outro sistema concebível. Espalhará mais amplamente o prazer de governar e tornará certo o que hoje permanece em dúvida: a compatibilidade entre o ser governado e conservar o amor-próprio. É que o governo sem dominação não ofende a nossa dignidade nem nega a nossa capacidade moral e política. O respeito mútuo e o amor-próprio compartilhados são apoios firmes da igualdade complexa e juntos constituem a fonte da sua possível resistência.


Michael Walzer, no seu livro “As Esferas da Justiça”, sustenta o pluralismo das esferas da justiça social ou distributiva e da igualdade. Partindo do facto de que as nossas convenções sociais levam à divisão da justiça em esferas autónomas relativamente ao princípio distributivo, agrega todo um conjunto de critérios aceites pela comunidade e denomina-os globalmente de “igualdade complexa”. Esta será a base para a distribuição social dado que a sociedade humana é, por natureza, uma comunidade distributiva, estamos juntos para partilhar, dividir e trocar.
Assim, Michael Walzer, com superior mestria, conduz-nos ao reconhecimento e assunção dos percursos do poder político no quotidiano dos cidadãos. Naturalmente, poderíamos pensar e até exigir ao autor outras abordagens, em concreto, sobre a teoria geral que formulou para a justiça social nas suas complexas esferas. A análise que difunde mostra-nos a complexidade inerente à tomada de decisões e coexistência sob o impacto dessas mesmas decisões.
          Para terminarmos, uma questão se coloca: – Que esferas da justiça, para o Portugal de hoje?

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