“Os prazeres intelectuais
são de uma qualidade mais elevada do que quaisquer outros”
Milton
Aproveitando o ensejo de termos sido convidados
para uma “auscultação/debate” com a deputada do Bloco de Esquerda (BE),
Catarina Soares Martins, com 38 anos de idade, circunstancialmente, com a
notação para os mais distraídos, licenciada em Línguas e Literaturas Modernas,
Mestre em Linguística e com frequência de Doutoramento em Didáctica das
Línguas, ligada a quatro comissões parlamentares, de que destacamos, por nos
aprazer profissional e culturalmente falando, a Comissão de Educação, Ciência e
Cultura e Comissão para a Ética, a Cidadania e Comunicação, resolvemos hoje deambular
pelos “Caminhos da Cultura”, tomando a preceito a conjuntura presente das
políticas de austeridade, os modelos de financiamento e o estigma destas coisas
da Cultura serem cada vez mais dispensáveis. Dizem-nos, com o maior desplante e/ou
arrogância ignorante, que para o Governo a Cultura deve ser vista como um
“projecto nacional”, mas o seu “valor” não pode ser medido “pelo montante” que
lhe é atribuído no Orçamento do Estado, e que estar desempregado é mau mas que,
como em qualquer crise, há perigo mas também há oportunidade de mudar de vida.
Só por nos sentirmos equidistantes destes presumíveis e vociferados devaneios,
é que não nos poderíamos furtar ao sentido crítico da questão, mesmo quando
ouvimos da boca do Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho, defender que “vale a
pena apostar na Cultura como um importante activo nacional”, citando ao mesmo tempo
a “Agenda Europeia para a Cultura num Mundo Globalizado”, da Comissão Europeia,
e os “estudos internacionais” que sublinham o contributo da Cultura no “reforço
das políticas de emprego”. Se, por um lado, pronunciamos a Cultura como o
garante da identidade de uma nação, por outro, inflectimo-nos nos custos, na
política de austeridade e nos modelos de financiamento, como se a Cultura e a
Educação fossem o cancro da presumível estabilidade financeira do país. Como
afirmaria a deputada Catarina Soares Martins, vivemos assim um tempo
complicado!
Para o nosso Primeiro-Ministro, ao afirmar – na
cerimónia de entrega do “Prémio Leya” a João Ricardo Pedro (de desempregado a
escritor) – que o valor da Cultura não se mede pelo montante da sua conta no
Orçamento do Estado e “que os domínios do espírito e da criatividade não
pertencem a ninguém, e certamente não ao Estado”, dizendo-se salvaguardar a
Cultura, “sem tentações paternalistas”, apoiando iniciativas públicas em
“distintos equipamentos culturais disponíveis” e fomentando “iniciativas
privadas”, pensaria ou estaria a tentar, a nosso modesto ver,
desresponsabilizar-se das obrigações do próprio Estado que, nesta área, tem
cortado “a torto e a direito”. Seria descortesia, ou talvez incongruência, da
nossa parte se não disséssemos que tal “emasculação” – com tendência a
agravar-se – já vem de anteriores governos. Porque não somos de memória curta,
tomamos a foice do intelecto as palavras de Manuela Ferreira Leite, em 2002: «(…)
não existe em Portugal uma política de
cultura, mau grado a intensa campanha de propaganda que tem sido levada a cabo
no sector». De facto, e continuando na paráfrase das suas palavras, havia e
«há, isso sim, um debitar de
considerações mais ou menos genéricas e mais ou menos teóricas, sem tradução
prática na realidade». Recordaremos também quando, nesse mesmo ano,
comutados com a eficácia na contenção das despesas, se extinguiu o Instituto Português
de Arqueologia (IPA), fundindo-o na estrutura do Instituto Português do
Património Arquitectónico e Arqueológico (IPPAR). Se havia coisas que, na
altura, não funcionavam, era precisamente a perseverança e o dinamismo na
defesa do nosso património cultural. Falavam – e continuarão a falar – mais
alto os “vendedores de mercadorias culturais”. E aqui, não excluiremos as
responsabilidades do poder local que muitas vezes não pretende imiscuir-se na
relação pacífica com as instituições culturais.
No diálogo que travamos – estando presentes
representantes do Centro Cultural do Alto Minho (CCAM), Centro Dramático de
Viana (CDV), Sociedade de Instrução e Recreio Darquense (SIRD), Associação dos
Grupos Folclóricos do Alto Minho, diversas associações amadoras e nós – com a
deputada Catarina Martins, foram abordados temas como as políticas de
austeridade na Cultura; o Património, com as consequentes alterações da própria
tutela; os modelos de financiamento; as direcções regionais para a Cultura que,
tendo em conta o sentido depreciativo, não passam de uma espécie de “governos civis”;
a Cultura como algo dispensável; a necessidade de não descorar da Cultura
Tradicional; o problema da Arqueologia – quantas estações arqueológicas
abandonadas, por falta de financiamento –; a emergência da Cultura Urbana
Contemporânea; que perspectivas em termos de apoio financeiro, por forma as
associações “culturais/profissionais” manterem programações e postos de
trabalho; o papel do poder central, local e associações culturais amadoras; os
espaços físicos e falta de um projecto global para a região, contrastando com a
enraizada cultura em circuito fechado.
Senhores “forjadores da política”, sem o paradigma
de sabedoria reaccionária, apenas se pede que não se “excitem” em complexos de
perseguição ou rotulação oposicionista, quando se fala em Arte, Cultura ou
Património. Que isto vai mal, vai!…
Para terminarmos, apenas uma reflexão magnificamente plasmada por Mattew
Arnold: «a cultura é a busca da nossa
perfeição total mediante a tentativa de conhecer o melhor possível o que foi
dito ou pensado no mundo, em todas as questões que nos dizem respeito». Esse
tem sido – e sempre será – o nosso exercício cognitivo.
1 comment:
Concordo bastante com este post. Tenho receio do que Portugal poderá oferecer aos meus filhos...em todos os aspetos, incluindo a cultura!
Eu faço a minha parte, e faço-a bem!!!
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